A relação simbiótica entre as desigualdades globais e as pandemias, como as da AIDS e COVID-19, foi tema de um diálogo digital organizado pelo UNAIDS em parceria com o Jornal britânico Financial Times.
O diálogo digital contou com um painel formado por Winnie Byanyima, diretora executiva do UNAIDS, Monica Geingos, advogada e primeira-dama da República da Namíbia, Sir Michael Marmot, diretor do Institute for Healthy Equity da University College London e Joseph Stiglitz, professor da Universidade de Columbia e ganhador do prêmio Nobel de Economia.
Os painelistas debateram como o mundo pode trabalhar para evitar crises devastadoras e discriminatórias de forma permanente no contexto das pandemias atuais e das que venham no futuro.
O evento online segue o anúncio, feito em 6 de junho, em Brasília, da criação do Conselho Global sobre Desigualdade, AIDS e Pandemias. “Neste diálogo, queremos enfatizar as relações entre desigualdades e as pandemias. Infelizmente vimos com a COVID-19 se repetir o mesmo padrão observado no início da pandemia de AIDS”, destacou Winnie Byanyima na abertura do evento.
Entre as semelhanças estão a falta de acesso a medicamentos e vacinas por países e populações de média e baixa rendas e como esta dificuldade de acesso impede que ambas as pandemias – da AIDS e da COVID-19 – acabem de forma permanente, aumentando, inclusive, o risco de novas pandemias.
As desigualdades sociais e de gênero também foram citadas como um dos grandes empecilhos que para uma reposta positiva, rápida e permanente para o fim das pandemias.
Mônica Geingos, considerada uma das 100 maiores lideranças econômicas da África, lembrou que a Namíbia é o segundo país mais desigual do continente africano, e que mulheres foram as principais vítimas da pandemia de COVID-19.
“Na realidade, vimos adolescentes, mulheres e garotas com dificuldade de acesso ao tratamento. Também vimos um aumento em gravidezes indesejadas e, infelizmente, estamos prevendo um aumento de infecções (por HIV) entre pessoas mais vulneráveis”, ressaltou Monica.
O tema econômico esteve presente na pauta do diálogo. Sir Michael Marmot lembrou que a desigualdade econômica e a falta de investimentos sociais levaram aos extremos da pandemia, atingindo, por exemplo, o Reino Unido muito fortemente. “Os arranjos socioeconômicos dão aberturas para esses problemas”, salientou.
O economista Joseph Stiglitz salientou como a falta de acesso a medicamentos, testes, vacinas e exames laboratoriais são “escolhas e resultados políticos”, e lembrou que as desigualdades não afetam apenas o acesso ao sistema de saúde, mas, também, a uma boa nutrição, “deixando mais vulneráveis todas as pessoas que não conseguem ter uma boa alimentação.”
No surgimento da COVID-19, lembrou Stiglitz, uma das ações óbvias teria sido garantir o acesso ao direito intelectual, algo já levantado pela OMS. Segundo ele, foi uma decisão “muito tola” que isso não tenha sido feito durante a pandemia. “Quando demoramos a dar uma resposta, encorajamos novas mutações (do vírus) e sabemos que (para evitar isso) esta foi a primeira coisa que deveria ter sido feita”, finalizou.
Sobre a pauta racial, Sir Marmot lembrou que cenários semelhantes foram observados no Reino Unido e no Brasil, onde houve um aumento da taxa de mortalidade por COVID-19 nas fases iniciais entre pessoas negras. Ele destacou que no Brasil, na última década, houve uma redução de 10% em novas infecções por HIV entre pessoas brancas, mas um aumento de 13% entre pessoas negras.
O Conselho Global vai reunir evidências essenciais para o trabalho de formuladores de políticas públicas, de forma a elevar a atenção política para a necessidade de ação. Ainda mais fundamental: vai ajudar a equipar a linha de frente de atuação das comunidades que lutam por suas vidas com recursos de advocacy, fornecendo-lhes o que precisam para influir nas mudanças políticas e de poder.
“Esperamos, com o Conselho Global, dar respostas às futuras pandemias sempre dando voz às pessoas que são mais impactadas por elas, pois todas as respostas devem ser direcionadas por dados e todas as pessoas têm de ser incluídas nessas respostas”, finaliza Winnie Byanyima.
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