Discurso de Winnie Byanyima, Diretora Executiva do UNAIDS, na abertura da Reunião de Alto Nível sobre a AIDS

Vossas Excelências, Distintos Delegados, Colegas, Amigos, Amigas.

Obrigada, Presidente da Assembleia Geral Bozkir, Cofacilitadores Embaixador Gertze, da Namíbia, e Embaixador Fifield, da Austrália, e todos os Estados-membros. De forma conjunta redigiram, negociaram e entregaram esta Declaração Política, que será a base do nosso trabalho para acabar com esta pandemia que tem devastado comunidades durante 40 anos.

A AIDS não acabou. É uma das pandemias mais fatais dos tempos modernos. Desde o começo da epidemia, 77,5 milhões de pessoas foram infectadas por HIV. Perdemos quase 35 milhões de pessoas por causa da AIDS. Uma morte por AIDS a cada minuto é uma emergência! As taxas de infecção por HIV não acompanham a trajetória que nos comprometemos de forma conjunta. De fato, em meio às consequências da crise de COVID-19, podemos, inclusive, ver uma retomada da pandemia de HIV.

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Mas uma pandemia interminável de HIV é evitável. Apesar de todos os obstáculos, se nos unirmos, podemos acabar com a AIDS como uma ameaça de saúde pública até 2030, tal como prometemos.

Entretanto, seguir fazendo o que temos feito resultará em fracasso. Os programas que permitiram avanços substanciais não seguirão garantindo que terminemos esta jornada porque o caminho esta interditado. As evidências e análises são nítidas. Desigualdades de poder, status, direitos e voz estão ajudando a impulsionar a pandemia de HIV. As desigualdades matam. Como estabelece a Estratégia Global de AIDS: para acabar com a AIDS, temos de acabar com as desigualdades que a perpetuam.

Há outro benefício nessa abordagem. As mesmas legislações, políticas e serviços de saúde centrados nas pessoas, que são necessários para acabar com a AIDS, também ajudarão o mundo a superar a COVID-19 e estar preparado para fazer enfrentar futuras pandemias e apoiar o crescimento econômico inclusivo e os direitos humanos de todas as pessoas. Nós faremos melhor.

Aqui há três mudanças ousadas que devemos fazer de forma conjunta:

  1. Precisamos acabar com as desigualdades no acesso às tecnologias sanitárias, impulsionando a ciência e garantindo que ela chegue a todo mundo. A COVID-19 mostrou que a ciência avança de acordo com a velocidade da vontade política.
    Precisamos acelerar a ciência sobre a AIDS investindo em inovações no tratamento, prevenção, atenção e vacinas como bens públicos mundiais. E precisamos impulsionar a ciência de maneira a reduzir as desigualdades em vez de aumentá-las. Por exemplo, devemos levar os novos medicamentos antirretrovirais de ação prolongada que facilitarão o tratamento e a prevenção do HIV às mulheres em toda a sua diversidade e a populações-chave no Sul global primeiro, não anos depois de que as pessoas nos países ricos tenham acesso. Vamos assegurar que todos os medicamentos que podem prevenir a morte de pessoas que vivem com HIV sejam fabricados por múltiplos produtores de maneira acessível, especialmente no Sul global, onde mais se concentra a enfermidade. Precisamos de financiamento, mas também temos de reformar as normas falhas de propriedade intelectual e apoiar a distribuição da produção globalmente, de modo que o acesso à ciência que salva vidas já não dependa do passaporte que cada pessoa tenha.
  2. Precisamos acabar com as desigualdades no acesso aos serviços essenciais, proporcionando saúde e educação para todas as pessoas. Para muitas comunidades, as novas infecções por HIV tornaram-se raras; e viver uma vida longa e plena com o HIV é comum. Mas dentro dos países, ou entre eles, uma lacuna cada vez maior separa quem tem acesso a serviços de prevenção, tratamento e assistência e tem seus direitos respeitados daquelas pessoas que são excluídas. Hoje estamos definindo metas ambiciosas e ousadas para alcançar 95% de quem precisa de tratamento e prevenção do HIV: para alcançar estas metas, precisamos redesenhar os serviços de HIV tornando-os de fácil acesso e pensados em função da vida das pessoas. Precisamos assegurar que todas as meninas completem a educação secundária e estejam empoderadas com acesso pleno a serviços e direitos. É necessário por fim às tarifas para pessoas por serviços essenciais e proporcionar estes serviços por meio de sistemas públicos financiados por impostos. Precisamos integrar os serviços proporcionados pela comunidade. Precisamos combater a evasão fiscal, que impede a obtenção dos recursos internos para a saúde e a educação. A maioria dos países em desenvolvimento enfrenta uma grave crise fiscal, com uma perda de recursos superior a 20% em 2020 e tem os orçamentos de saúde ameaçados – e África sofre uma pressão especial. Este é o momento para aumentar as receitas e isso requer o fim da evasão fiscal e da competição fiscal que esvaziam os cofres públicos. Também necessitamos uma reestruturação da dívida para superar o impacto da COVID-19 e o estabelecimento de um mecanismo justo de resolução da crise da dívida. Devemos intensificar, não retroceder, o compromisso de destinar 0,7% do Produto Interno Bruto (PIB) de todos os países desenvolvidos e assegurar que a maior parte dos Direitos Especiais de Saque do FMI, no valor de 650 bilhões de dólares, fluam para países de renda baixa e média.
  3. Precisamos acabar com as desigualdades na implementação dos direitos, em particular para as pessoas que vivem com HIV e as pessoas vulneráveis ou afetadas pelo HIV. Felicito o compromisso dos Estados-membros de reformar as legislações e proteger os direitos. A evidência mostra que, quando as leis se fortalecem para apolar a igualdade de gênero e os diretos das populações-chave e enfrentar a estigmatização, os países têm muito mais sucesso nos programas de tratamento e prevenção, beneficiando a todas as pessoas. Fizeram retroceder os avanços relacionados ao HIV. Precisamos seguir avançando em nossa jronada comum, longe das legislações que causam danos, punitivas, obsoletas, muitas vezes coloniais, e de todas as formas de discriminação.

Este momento exige que trabalhemos de forma conjunta em todos os setores, em todos os países. As falsas promessas do populismo estão demonstrando que não estão à altura da biologia: como nos recorda a COVID-19, não apenas estamos interconectadas e interconectados, como somos inseparáveis.

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Não podemos acabar com a AIDS apenas em um país ou continente, só podemos acabar com a AIDS em todos quando isso acontecer em todos lugares.

Parabenizo os grupos da sociedade civil de todo o mundo cuja luta contra as desigualdades são um estímulo para a ação. Vocês, comunidades, grupos de mulheres e movimentos de base, têm nos encorajado constantemente. Às vezes, essa pressão pode ser desconfortável, mas minha mensagem para vocês é: sigam nos encorajando. Sigam lutando! A pressão do poder das pessoas é chave para acabar com as desigualdades e com a AIDS.

Martin Luther King disse que o arco moral do universo é longo, mas se inclina em direção à justiça. Ele não quis dizer que este processo é automático. Como ele destacou: “o progresso social nunca se move sobre as rodas da inevitabilidade; vem de um esforço incansável das pessoas”. A trajetória das novas infecções por HIV e das mortes relacionadas à AIDS não se reduzirão pelas iniciativas de sempre, mas podemos forçá-las a diminuírem.

Não podemos ocupar uma posição de neutralidade frente às desigualdades. Para voltar ao caminho para acabar com a AIDS devemos exercer a proatividade para enfrentá-las. A única alternativa é um círculo vicioso de injustiça, enfermidade e emergência. O mais irreal que poderíamos fazer agora é imaginar que podemos superar nossas crises mediante pequenos ajustes ou retoques.

Depende de apenas de nós como queremos que fique a nossa marca: como pessoas que quebraram promessas ou cumpriram suas promessas, como pessoas fracassadas ou vencedoras, como as pessoas que acabaram com a AIDS ou somente como as pessoas que poderiam ter acabado com a AIDS.

As epidemias amplificam nossas piores características—as desigualdades, as injustiças e o medo; mas também as nossas melhores características— ingenuidade, resistência e coragem.

Confio que vamos vencer, de forma conjunta.

Obrigada.

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