Vislumbrar o fim da epidemia da AIDS não é mais utopia – é um compromisso

Senhoras e senhores, boa noite.

Hoje estou aqui representando o Sr Michel Sidibé, Diretor Executivo do UNAIDS e suas agências co-patrocinadoras.

O 10º  Congresso de AIDS e 3º Congresso de Hepatites Virais acontece em um momento oportuno.

O mundo acaba de adotar os Objetivos Globais para o Desenvolvimento Sustentável e as nações signatárias se comprometeram, coletivamente, a Acelerar a Resposta para chegarmos ao fim da epidemia de AIDS até 2030.

Vislumbrar o fim da epidemia não é mais utopia – é um compromisso.

Alcançamos este ano as metas para AIDS previstas no Objetivo de Desenvolvimento do Milênio 6 (ODM 6), de parar e reverter o curso da epidemia de AIDS.

Pela primeira vez na história das Nações Unidas, conseguimos alcançar uma meta antes do prazo originalmente definido e colocar 15 milhões de pessoas em tratamento. Essa meta, aliás, era considerada inatingível por muitos, quando no ano 2000 tínhamos apenas 1 milhão de pessoas em tratamento.

Esse êxito se deve a um compromisso sem precedentes de governos, organismos internacionais, cientistas, setor privado, pessoas vivendo com HIV e a sociedade civil.

Mas nosso desafio ainda é grande.

O fim da epidemia requer ainda mais investimento, compromisso, engajamento e inovação.

Os últimos quilômetros de uma maratona são sempre os mais difíceis. É a hora do sprint final, de buscarmos fôlego onde já não achávamos que seria possível.

Imbuída desse espírito, duas semanas atrás, a Junta Coordenadora do UNAIDS aprovou a nova estratégia para o Programa Conjunto da ONU sobre HIV/AIDS, para o período de 2016 a 2021.

E a estratégia propõe novas metas:

  • As – já famosas – metas de tratamento 90-90-90
    • que até 2020, 90% das pessoas vivendo com HIV estejam diagnosticadas e conheçam seu estado sorólogico
    • que destas, 90% estejam em tratamento
    • e que destas, 90% vivam com carga viral indetectável.

A nova estratégia também estipula:

  • metas para que 90% das pessoas tenham acesso a serviços de prevenção do HIV, incluindo o preservativo, além de serviços de saúde sexual e reprodutiva.
  • Zero nova infecção em crianças.
  • Acesso equitativo para populações-chave, com 90% das pessoas mais vulneráveis tendo acesso assegurado a serviços de prevenção combinada.
  • Que 90% de pessoas vivendo com HIV relatem experiências de Zero Discriminação
  • Entre outras

Estas metas demonstram bem que, para acabar com a AIDS, não é suficiente apenas o tratamento – é necessário reinventar a prevenção e promover a justiça social e os direitos humanos.

E estamos sedentos por mais justiça social e mais respeito aos direitos humanos.

Enquanto estamos aqui reunidos neste 10º Congresso de AIDS, vemos um recrudescimento global da intolerância e do extremismo.

Apenas no último mês vimos atentados covardes em Sharm El Sheik (no Egito), em Beirute (no Líbano) e em Paris (na França).

A intolerância que aparece de formas tão extremas, não foi criada da noite para o dia.

Aqui, bem mais perto de nós, também testemunhamos formas extremas de intolerância e de violência.  

Um dos exemplos mais evidentes e tristes é a violência que sofrem nossas trans e travestis.

O Brasil hoje é o país onde mais se assassinam pessoas trans no mundo, segundo a organização Transgender Europe, que reuniu dados de janeiro de 2008 a dezembro de 2014. 

De acordo com o levantamento, 40% dos assassinatos de pessoas trans na mundo aconteceram no Brasil.  

Esse cenário traz consequências gravíssimas para a epidemia de AIDS. O UNAIDS estima que, mundialmente, cerca de 19% delas vivem com o vírus em todo o mundo.

A violência e discriminação que sofrem gays e outros homens que fazem sexo com homens também é inaceitável. Dados da Secretaria Nacional de Direitos Humanos mostram que em 2014, a cada hora, 1 gay sofreu violência no Brasil. E, como veremos em várias discussões do Congresso, essa população também é uma das mais vulneráveis à epidemia.  

A violência contra mulheres também é alarmante: de acordo com o relatório conjunto da OPAS/ ONUMulheres/Secretaria Especial de Politica para Mulheres e da Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais (FLACSO), em 2013, 13 mulheres foram assassinadas por dia no Brasil. Um aumento de mais de 250%  em relação a 1980. A maioria delas em casa, por seus companheiros ou pessoas da família.

Este também é mais um contexto de vulnerabilidade que traz números tristes sobre a epidemia. No mundo todo, AIDS continua sendo a maior causa de mortes de mulheres e meninas em idade reprodutiva.

Lembremo-nos também das diversas formas de violência e intolerância que atingem outras populações-chave: além das pessoas vivendo com HIV, as pessoas privadas de liberdade, os migrantes, as pessoas que injetam drogas e usuários de crack, profissionais do sexo, pessoas deslocadas, pessoas com deficiência e aquelas com 50 anos ou mais.

A violência e a intolerância ganham terreno porque há falta de educação e preparo dos nossos jovens – onde as questões de sexualidade e de gênero vêm sendo sistematicamente retiradas das escolas. E relatos de bullying e discriminação também seguem aumentando sistematicamente.   

Intolerância que também vejo todos os dias, de forma muito próxima, quando recebo mensagens de jovens via Facebook, Whatsapp e e-mail. Denunciando violência, bullying, pedindo ajuda, pedindo que se respeitem seus direitos.

Direitos Humanos têm que ser parte central do nosso trabalho e estar no coração de nossas estratégias. São parte intrínseca do desenvolvimento de qualquer nação. Direitos humanos são universais e não podem ser plataforma de um ou outro partido. Precisam estar na agenda de todos os que acreditam no futuro do país.   

A estratégia 2016-2021 do UNAIDS nos estimula a trabalhar para fortalecer os elos entre saúde e justiça, saúde e equidade, saúde a inclusão, saúde e bem estar,  saúde a paz.

E estamos aqui para apoiá-los nesta empreitada.

Por isso, gostaria de concluir agradecendo o compromisso do governo brasileiro, governos estaduais e municipais, do Congresso e da Frente Parlamentar de Luta contra AIDS, da academia, do setor privado, da sociedade civil e de pessoas vivendo com HIV aqui no Brasil em relação ao avanço em direção as estas metas globais.

O Brasil tem sido um aliado de peso, e colocou em campo um arsenal muito importante contra a epidemia: sua estrutura governamental, novas tecnologias e sua ampla rede de saúde, além, é claro, de muita força de vontade e engajamento.

Meu agradecimento especial ao Dr Fábio Mesquita, que tem feito a diferença desde sua chegada ao Departamento em 2013.

Desde o inicio da epidemia, 76 milhões de pessoas se infectaram pelo HIV no mundo todo. Hoje são quase 37 milhões de pessoas vivendo com o vírus.  

Nós temos o dever, em relação a essas pessoas, em relação aos nossos jovens e também às gerações futuras, de preparar um mundo – e um Brasil  –  com zero nova infecção, zero discriminação discriminação e zero morte relacionada à AIDS.

Aproveito para saudar a juventude aqui representada de diversas formas, em especial, ao pessoal do Curso de formação de Jovens Lideranças. É um prazer enorme vê-los aqui, participando deste momento tão importante.  

O fim da epidemia de AIDS deve ser o nosso legado – e nós acreditamos firmemente que isso é possível.

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