Imagine ser amplamente culpabilizado pelas tragédias que acontecem em seu país. Terremotos. Furacões. Inundações. Agora imagine sofrer exclusão dos esforços de resposta a desastres por causa disso.
A comunidade LGBTQIA+ no Haiti enfrenta um profundo preconceito. A discriminação muitas vezes reduz as chances de vida. A educação e as oportunidades de emprego são limitadas e mesmo o acesso à saúde pode ser difícil.
Fundada em 1999, a Fundação SEROvie associa a promoção da saúde para a comunidade LGBTQIA+ com a defesa dos direitos humanos e o empoderamento socioeconômico. Hoje, a organização opera projetos em nove regiões do Haiti.
O UNAIDS apoia a SEROvie para assegurar que as necessidades das comunidades de populações-chave sejam atendidas durante as respostas aos desastres. Esta intervenção assegura que as pessoas vivendo com HIV continuem a receber tratamento de HIV e tenham acesso oportuno à ajuda. Além da fase de emergência, as pessoas beneficiárias recebem apoio para retomar a geração de renda e se reintegrarem a suas casas. Também recebem apoio psicossocial para lidar com a dor e o trauma.
Em 2016, a SEROvie fundou a Clínica J.C Ménard em Porto Príncipe, capital do Haiti. Esta clínica atende pessoas LGBTQIA+ e outras populações-chave, incluindo trabalhadoras do sexo e sua clientela. No Haiti, a SEROvie aglutinou mais de duas décadas de experiência no fornecimento de apoio social e de saúde em um pacote completo de serviços.
Com o apoio de diferentes organizações, incluindo a Agência Norte-Americana para o Desenvolvimento Internacional (USAID), a J.C Ménard oferece uma gama de serviços gratuitos que abrangem a violência baseada no gênero, estigma e discriminação, planejamento familiar e prevenção do HIV, incluindo a PrEP. Também oferece tratamento e cuidados contra o HIV, IST e tuberculose.
No laboratório próprio da organização, sua equipe técnica gerencia tanto o diagnóstico quanto o monitoramento do tratamento. Também faz o rastreamento da jornada individual desde o teste positivo até a supressão viral. Durante o último ano, a clínica forneceu seis mil testes de HIV e apoiou o gerenciamento do tratamento do HIV para mais de 1.500 pessoas. Além de dispensar os medicamentos a pacientes, a clínica coordena com outras instalações de tratamento para garantir que não haja falta de estoque e que os medicamentos não expirem.
A equipe de assistentes sociais realiza avaliações individuais para determinar as necessidades das pessoas atendidas. A psicóloga Darline Armand diz que o momento mais importante em seu trabalho é a primeira interação após o diagnóstico positivo para HIV.
“Essas pessoas precisam se sentir seguras”, diz ela.
O supervisor de pares, Gregory Jacques, explica que a clínica emprega tanto a educação entre pares, quanto a navegação entre pares como abordagens estratégicas. Educadores engajam as pessoas atendidas em temas relacionados a relacionamentos, riscos e segurança, fornecendo informações precisas. A equipe de navegadores é composta por pessoas vivendo com HIV que orientam no processo de tratamento e cuidado.
“O que faz a diferença é que as pessoas atendidas sabem que você é igual a elas”, explica um navegador.
Na sala comunitária, quem está em atendimento aprende sobre saúde e relacionamentos por meio de atividades divertidas. É também aqui que se reúnem para participar em grupos de apoio e de diálogos.
A equipe de Monitoramento e Avaliação mede o desempenho do programa com detalhes minuciosos. Tudo é acompanhado, desde o número de pessoas vivendo com HIV identificadas por meio de testes até o número de sessões de sensibilização realizadas por sacerdotes Voodoo. No ano passado, mais de 15 mil pessoas receberam da clínica mensagens de conscientização sobre o HIV, a violência baseada em gênero e estigma e discriminação. Mais de 1.500 pessoas se beneficiam de serviços abrangentes de atendimento e tratamento do HIV, enquanto mais de 1.500 estão no PrEP.
Steeve Laguerre, cofundador da SEROvie, reflete sobre a jornada da organização com admiração e clareza.
“Os serviços que prestamos são inteiramente determinados pelas necessidades das pessoas que servimos”, diz ele. “Buscamos um financiamento que se alinhe com essas demandas. O trabalho é sempre voltado para as pessoas que são atendidas”.
Esta abordagem centrada nas pessoas é valiosa para o Caribe como um todo. De acordo com a Relatório Global de AIDS 2022, Em Perigo, disponível em inglês, no ano passado, quatro de cinco novas infecções na região estavam ligadas às populações-chave e suas parcerias sexuais. Ao mesmo tempo, a maior parte do financiamento para atividades regionais de prevenção de combinação com populações-chave vem de fontes internacionais.
“Estratégias lideradas pela comunidade para o atendimento ao paciente ajudam a reduzir o diagnóstico tardio e a interrupção do acompanhamento, ao mesmo tempo em que melhoram os resultados do tratamento”, defende o Dr. Christian Mouala, diretor nacional do UNAIDS para o Haiti. “Estas abordagens devem ter recursos adequados e ser integradas na resposta nacional”.