Como parte das celebrações pelo Dia Internacional da Visibilidade Trans (31/3), o UNAIDS concluiu no fim de março (28/3), em São Paulo, o curso de noções básicas de técnicas em audiovisual Luz, Câmera, Zero Discriminação. A formação fez parte de um projeto do UNAIDS financiado pelo M·A·C AIDS Fund—no âmbito da iniciativa Fast-Track Cities (Aceleração da Resposta ao HIV nas Cidades)—e foi realizada com apoio da Coordenação de Políticas para LGBTI+ da Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadania de São Paulo.
“Mesmo em uma área considerada de fácil acesso para todas as pessoas, como a Internet, constatamos que as pessoas trans ainda encontram obstáculos para ter voz e espaço garantidos e respeitados. Essa formação surgiu com o objetivo de ampliar essa voz, para que vocês possam produzir seus próprios conteúdos e também trabalhar em conjunto entre si e no mercado de audiovisual para conquistar esse espaço”, explica Georgiana Braga-Orillard, Diretora do UNAIDS no Brasil. “E chegamos ao final desta etapa muito satisfeitos de saber que a partir de agora, temos uma rede de pessoas trans engajadas com uma área tão importante, como a do audiovisual, para a consolidação dessa estratégia.”
Das 48 inscrições recebidas pelo UNAIDS para o curso, 20 pessoas foram selecionadas, das quais 16 efetivamente iniciaram o curso e conseguiram concluir todas as etapas para receber o certificado de conclusão. Os dez encontros aconteceram no Centro de Cidadania LGBTI+ Luiz Carlos Ruas, em São Paulo, entre 27 de fevereiro e 28 de março, e abordaram temas como fotografia, sonorização e produção, além de roteiro, pré-produção, direção, fotografia, filmagem, edição e pós-produção. A produtora Brodagem Filmes foi selecionada para montar e conduzir o treinamento.
“Quando comecei, eu confesso que tive dificuldade de compreender as diferentes visões e desejos de muitas pessoas no grupo. Eu mesmo ficava muito trancado em casa, e quase não me relacionava com outras pessoas trans. Fomos construindo um ambiente muito bacana e, ao final, formamos um grande time de pessoas engajadas com o audiovisual e parceiras para a vida”, relata Raphael Menezes, um dos participantes do curso. “Agora, eu quero trabalhar nessa área. Podem me contratar”, brincou com a plateia durante a cerimônia de encerramento.
Ao final de cada parte teórica, os participantes tiveram que colocar em prática o conteúdo aprendido. Para a realização dos projetos de conclusão do curso, a turma foi dividida em três grupos, que produziram dois curtas ficcionais—(R)Existir e Somos Todxs Humanxs—e um documental —TransMasculinidades.
“Como desenvolvedores e condutores do curso, foi um desafio enorme, e ao mesmo tempo uma oportunidade maravilhosa, poder oferecer neste mês o melhor da nossa experiência profissional, o que carregamos ao longo dos anos de conhecimento teórico e prático”, conta Lucas Kakuda, um dos sócios da empresa responsável pela construção e execução do curso. “Trocar e compartilhar com tantas pessoas distintas e talentosas foi enriquecedor, não só como ministrantes mas como pessoas mesmo.”
Além disso, juntos os participantes do Luz, Câmera, Zero Discriminação se uniram para a produção de uma campanha a ser veiculada nas redes sociais—provisoriamente intitulada de Bandeira—alertando as pessoas sobre a importância da representatividade trans no audiovisual. Este último vídeo foi inspirado no filme Trans 102, produzido em inglês pela Refinery29, uma empresa de entretenimento e mídia digital focada em mulheres jovens, em parceria com a MAC Cosmetics.
“Foi uma honra poder receber aqui em São Paulo e poder apoiar esse projeto tão importante para a cidade e para o que temos promovido em nosso trabalho”, disse Ivan Batista, Coordenador do Centro para Políticas LGBTI da Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadania de São Paulo. “Desejo sucesso a cada participante e já aproveito para convidar todo mundo a se unir a nós nas iniciativas de resposta à epidemia de HIV, como a Caminhada da AIDS, que terá sua segunda edição na cidade no início de dezembro.”
O objetivo do projeto de formação em audiovisual é contribuir para a redução do estigma e da discriminação em relação às pessoas trans e abrir espaços para que elas possam se apropriar das mídias sociais e de outras plataformas de audiovisual, fomentando o acesso a esse mercado de trabalho, tanto diante quanto atrás das câmeras.
“Dar voz e apoiar a tomada dos espaços pelas pessoas trans significa, em última instância, construir a agenda para Zero Discriminação no mercado de trabalho, nas escolas, na saúde e nas diversas áreas da vida em sociedade”, explicou a Diretora do UNAIDS durante a cerimônia. “Queremos que travestis e pessoas trans, ao lado de outras populações-chave para a resposta à epidemia de HIV, sejam não apenas incluídas na sociedade, mas acima de tudo respeitadas.”
Dados mais recentes do Ministério da Saúde estimam que mais de 31% das travestis e pessoas trans vivam com HIV no Brasil, enquanto na população em geral, a prevalência é de algo em torno de 0,4%. Assim como mais de 200 cidades ao redor do mundo, São Paulo é uma das signatárias da Declaração de Paris, que prevê um compromisso de Aceleração da Resposta ao HIV para alcançar, entre outras coisas, as metas 90-90-90, propostas pelo UNAIDS: ter, até 2020, 90% das pessoas estimadas com HIV diagnosticadas; ter 90% destas em tratamento antirretroviral; e ter 90% deste grupo com carga viral indetectável—quando a quantidade de vírus circulando no organismo é tão baixa que a chance de transmissão do HIV para outra pessoa é praticamente zero.
O MAC AIDS Fund, responsável por parte dos recursos utilizados na realização da formação, é pioneiro no financiamento de campanhas em torno do HIV e da AIDS, fornecendo apoio financeiro a organizações que trabalham com regiões e populações mais vulneráveis à epidemia. “Na qualidade de maior doador corporativo não farmacêutico dessa área, o M·A·C AIDS Fund se dedica a enfrentar a ligação que existe entre pobreza e o HIV por meio do apoio a diversas organizações no mundo inteiro que oferecem amplo leque de serviços a pessoas vivendo com HIV ou vulneráveis ao vírus”, explica o Fundo em seu website.”
A cerimônia de encerramento aconteceu no Centro Brasileiro Britânico (CBB), em São Paulo, com o apoio da Cultura Inglesa. O evento teve um pocket show da cantora Renata Peron, uma das alunas do projeto Luz, Câmera, Zero Discriminação.