Pessoas trans exigem o direito à saúde

Uma conversa com Marcela Romero

Marcela Romero é uma ativista argentina reconhecida por sua luta pelos direitos das pessoas trans. Atualmente, Marcela é Presidente da FALGBT (Federação Argentina de Lésbicas, Gays, Bissexuais e Trans), Presidente da ATTTA (Associação de Travestis, Transsexuais e Transgêneros da Argentina) e Coordenadora Regional da Rede Latino-Americana e Caribenha de Pessoas Trans (REDLACTRANS).

O que o direito à saúde significa para você?

Para mim, o direito à saúde significa direitos iguais. Sem o direito à saúde, a prevenção, o cuidado e o tratamento do HIV não existem, nem a cobertura universal à saúde. Quando os cuidados de saúde não estão garantidos como um direito humano, a pobreza e a exclusão social aumentam, e vidas são perdidas. As pessoas mais vulneráveis ​​da região—como migrantes, populações deslocadas, população encarcerada e pessoas trans—são aquelas às quais esse direito básico e universal é frequentemente negado. Estamos morrendo de doenças evitáveis ​​e curáveis, como tuberculose, pneumonia e hepatite, que são doenças que contribuem para o círculo de pobreza e exclusão.

O que impede que pessoas transgêneros possam exercer seu direito à saúde?

A violência, o estigma, a exclusão social e a discriminação influenciam negativamente o exercício do direito à saúde. Também desencorajam as pessoas trans e as populações-chave de buscar serviços de prevenção, tratamento, cuidados e apoio relacionados ao HIV.

Os preconceitos apresentados pelos profissionais de saúde e sua falta de informação são apenas dois exemplos de obstáculos. Além disso, existem apenas alguns programas de saúde sexual e reprodutiva na região que são orientados a pessoas transgênero. É raro que as pessoas trans tenham acesso regular a serviços adequados de saúde sexual e reprodutiva e de HIV.

O que mais pode ser feito para garantir que as pessoas trans possam acessar os serviços?

Estamos mudando os indicadores de agências de cooperação internacional e planos governamentais para que eles invistam mais em saúde e direitos humanos para populações-chave. Buscamos e facilitamos mais espaços de diálogo para que as pessoas trans sejam mais visíveis, participem da tomada de decisões e contribuam para as políticas públicas governamentais. Também estamos trabalhando na redução do estigma e da discriminação na sociedade através de campanhas de conscientização com contribuições do UNAIDS, do Fundo Global contra a Aids, Tuberculose e Malária, e do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), bem como de outras organizações parceiras.

No âmbito comunitário, inauguramos recentemente a Transgender House (Casa Transgênero), um espaço onde as pessoas trans recebem orientação sobre diferentes problemas, incluindo a prevenção do HIV. É necessário pôr fim à violência institucional baseada em gênero que as pessoas trans sofrem por causa da identidade de gênero. Através do nosso Centro de Documentação para Pessoas Trans da América Latina e do Caribe, estamos monitorando violações de direitos humanos contra pessoas trans e o direito à saúde é um dos principais componentes que estamos monitorando.

Finalmente, é urgente aprovar leis e implementar políticas que facilitem o reconhecimento legal do gênero de pessoas trans. As leis de identidade de gênero reconhecem pessoas trans como seres humanos, como cidadãos, para que tenham o direito de acessar os serviços públicos e sejam incluídas nas agendas governamentais. Essas leis permitem que pessoas transgênero acessem os mesmos benefícios e oportunidades que qualquer outro cidadão teria, incluindo o acesso a serviços de saúde. Sem esse direito, não podemos acessar a prevenção, cuidados e tratamento do HIV.

Você acha que a situação melhorou nos últimos 20-30 anos?

Sim, ainda podemos melhorar a situação em que vivemos, mas, como pessoas trans, temos que sair da escuridão. Nossos problemas devem ser incluídos e visíveis nas agendas políticas. Temos que trabalhar de forma transversal para que as pessoas trans sejam reconhecidas e seus direitos humanos sejam garantidos, incluindo o direito à saúde. Preocupa-me que, em alguns países da região, vivenciamos contratempos e um aumento da violência baseada no gênero. Os direitos humanos devem ser a nossa luz orientadora. Sem uma abordagem baseada em direitos, a Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável não poderá prosperar e ser eficaz.

Não estamos pedindo outros direitos, estamos apenas pedindo os mesmos direitos, como qualquer outro cidadão. Uma pessoa que não possui uma identidade não existe e somos parte da sociedade.

REDLACTRANS é uma rede de pessoas transgênero da América Latina e Caribe. Trabalha com o objetivo de garantir o cumprimento dos direitos humanos para pessoas transgêneros na região através do uso de estratégias relacionadas a advocacy político, conscientização social, participação organizacional e fortalecimento da saúde, educação, justiça e igualdade.

Leia mais no relatório do UNAIDS sobre o Direito à Saúde.

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