“Muitas de nós, trabalhadoras do sexo, não conseguimos nos colocar em isolamento. Não tivemos esse privilégio porque a maioria de nós somos provedoras dos nossos lares.” Assim Juma Santos, coordenadora da ONG Tulipas do Cerrado, define um dos desafios que motivam o trabalho de apoio à informação, prevenção e redução de danos prestado pela organização às trabalhadoras do sexo no Distrito Federal e entorno.
Oito multiplicadoras selecionadas pela Tulipas do Cerrado receberam formação com foco na prevenção da COVID-19, do HIV e de outras infecções sexualmente transmissíveis e trabalharam por três meses no compartilhamento dessas informações com trabalhadoras sexuais cis e trans, além de pessoas em situação de rua.
Em 2021, a ONG foi uma das selecionadas pela Chamada para Propostas para o Fortalecimento das Organizações Baseadas na Comunidade que trabalham na resposta ao HIV na América Latina e no Caribe no contexto da pandemia da COVID-19, coordenada pelo escritório regional do UNAIDS para América Latina e Caribe.
A partir das formações recebidas, as multiplicadoras se distribuíram em grupos que circularam pela Avenida W3 Norte e na rodoviária, localizadas no Plano Piloto de Brasília, para distribuir máscaras de tecido, preservativo interno e externo, informação sobre prevenção combinada (especialmente PrEP) e, em alguns casos, fornecer acolhimento às mulheres. Durante as visitas de campo noturnas, que aconteceram duas vezes por semana, as Tulipas atenderam entre 40 a 100 trabalhadoras por noite. Já na rodoviária, foram cerca de 20 pessoas atendidas por visita de campo.
“A gente diz ‘olha, temos máscara’, e, por meio da máscara, as pessoas começam a conversar com a gente e a se abrir, a pedir informação”, conta Jackeline Santos da Silva, redutora de danos voluntária e multiplicadora.
As multiplicadoras de saúde também realizaram formações em Valparaíso de Goiás (GO) e Taguatinga (DF) e distribuíram cestas básicas para as trabalhadoras do sexo em situação de maior vulnerabilidade.
De acordo com Juma, não só as trabalhadoras do sexo, mas também as pessoas em situação de rua, precisam desse trabalho. Ela diz que muitas mulheres em situação de rua fazem uso de drogas e realizam o trabalho sexual para manter o vício.
“Não podemos falar só de preservativo ou só sobre HIV. Quando falamos sobre prevenção combinada também também precisamos incluir a máscara, o uso de álcool em gel. Pessoas em situação de rua têm muita dificuldade de higienização, de lavar a mão, de fazer uso da máscara”
Juma Santos, coordenadora da ONG Tulipas do Cerrado
De acordo com o relatório global do UNAIDS Enfrentando Desigualdades – Aprendizados dos 40 anos de AIDS para respostas a pandemias, publicado em 2021, quando comparado com a população em geral, as trabalhadoras do sexo estão 26 vezes mais expostas ao risco de contrair HIV, enquanto que mulheres trans estão 34 vezes mais expostas.
“Com a COVID-19, as pessoas que estavam afastadas do serviço de saúde foram ainda mais empurradas às margens. O trabalho da Tulipas do Cerrado alcança as pessoas que estavam ficando para trás, o que reforça o papel das comunidades para a redução das desigualdades”, explica Ariadne Ribeiro, oficial para Comunidade, Gênero e Direitos Humanos do UNAIDS no Brasil.
As multiplicadoras do cuidado da Tulipas do Cerrado são ou foram trabalhadoras do sexo. A escolha por elas leva em conta a criação de vínculos e a importância de uma abordagem entre pares para compartilhamento da informação.
“Agora as trabalhadoras do sexo estão aceitando ouvir mais sobre PrEP e outras formas de prevenção. No início do projeto, elas não queriam muito papo. Criamos um vínculo com as meninas e agora elas estão mais abertas para ouvir”, explica Victoria Helen Ribeiro Lima, enfermeira, redutora de danos voluntária e coordenadora do projeto.
Conheça a primeira parte da história de Juma Santos, trabalhadora sexual e fundadora da ONG Tulipas do Cerrado
Juma Santos, trabalhadora sexual e fundadora da ONG Tulipas do Cerrado, segue contando um pouco da sua história
Abaixo podem ser conferidas as histórias de:
Danielly Melk e Sendy Marques, trabalhadora sexual e redutora de danos e multiplicadora, respectivamente;
Maria Aparecida Rodrigues, trabalhadora do sexo e multiplicadora de saúde;
Helen de Castro, trabalhadora do sexo e beneficiada pelo trabalho da ONG.