Boa parte da história de vida profissional da socióloga Telva Barros é entrelaçada com a resposta ao HIV no Brasil. Ela foi a primeira funcionária do UNAIDS no país, mas já estava envolvida com o tema desde os anos 80, quando a epidemia de AIDS estava em seu início. Hoje, aposentada, ela mantém sua convicção mais forte do que nunca sobre o papel fundamental da ONU para a paz e os direitos humanos.
A ligação de Telva com a resposta à AIDS surgiu indiretamente, em meados dos anos 80, quando começou a trabalhar em uma autarquia do governo do estado de São Paulo dedicada à prevenção às drogas, o Instituto de Medicina Social e de Criminologia de São Paulo (Imesc). Isto coincidiu com o início da epidemia de AIDS, que trazia também o risco de infeção por HIV para pessoas que usavam drogas injetáveis.
“Para mim, o tema de prevenção sempre foi fundamental, tanto na resposta às drogas, quanto ao HIV. Nos anos 90, trabalhei cinco anos no Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento (USAID) justamente com esta abordagem. Por conta disso, me envolvi diretamente com o início da resposta ao HIV no Brasil. Estive junto de todo esse pessoal pioneiro, que esteve à frente da resposta inicial ao HIV e à AIDS no país, seja no governo ou na sociedade civil, e que são parte da história da minha vida”, diz Telva.
Ela destaca que aquele foi um momento especial, no qual o Brasil tornou-se rapidamente referência na resposta ao HIV em todo o mundo. “As razões pelas quais nosso país virou uma vitrine mundial na resposta ao HIV acredito que se devem à conjuntura política, com o apoio de diferentes governos, à força e comprometimento das organizações da sociedade civil e de ativistas e à existência de recursos de diferentes doadores. Foi um momento muito especial.”
Desde 1996, quando ouviu falar da criação do UNAIDS, Telva aspirava a trabalhar no programa. A oportunidade chegou em 2000, quando a representação foi aberta no país. “No começo o UNAIDS não tinha escritório próprio e meu primeiro espaço de trabalho foi uma mesa na UNESCO, que liderava o grupo temático de HIV/AIDS. E ali estava eu entrando naquele mundo ONU. Com o tempo, a equipe foi crescendo e depois de três anos já tínhamos nosso escritório próprio”, relembra.
A experiência de Telva não se limitou ao Brasil. Ela foi diretora do UNAIDS em Moçambique por dois anos. Em seguida, foi para o Escritório Regional do UNAIDS para América Latina e Caribe, onde ficou por três anos e teve a oportunidade de conhecer em profundidade a realidade da região como um todo. Veio, então, o momento da aposentadoria, em 2009, quando saiu do UNAIDS, mas continuou trabalhando em consultorias por algum tempo com o tema de HIV/AIDS.
Sobre o papel das Nações Unidas, especialmente no contexto atual, Telva não hesita: “A ONU segue sendo mais essencial do que nunca porque tem a capacidade de catalizar e trazer para a pauta os temas essenciais da humanidade. Mais do que nunca é o nosso papel, como organização internacional, mostrar as falhas e indicar os caminhos”.
A aposentadoria não afastou Telva do contato com o sistema ONU. Ela tem participação ativa na Associação dos Antigos Funcionários Internacionais do Brasil (AAFIB), criada em 1987 para, entre outros objetivos, contribuir para preservar a imagem e manter a memória do Sistema das Nações Unidas.
“Somos 177 filiados, a maioria com mais de 70 anos. Cumprimos nosso papel de apoio às pessoas que se aposentaram do sistema ONU, mas que continuam sendo a memória viva da organização. Fazemos atividades culturais e neste ano até ganhei um concurso de crônicas com um texto em que compartilho um pouco das minhas memórias pessoais”.
Telva é convidada algumas vezes para dar palestras e compartilhar sua experiência, especialmente para estudantes. “É muito interessante porque muitas vezes nunca viram alguém que tenha trabalhado na ONU. Querem saber tudo. A mística da organização ainda é muito forte. Digo que sou uma pessoa normal. Apenas fiz um juramento, como international civil servant, de prestar um serviço para a humanidade, do qual muito me orgulho”, finaliza.