Mais de 170 ex-chefes de Estado e de governo e ganhadores do Prêmio Nobel, incluindo o ex-primeiro ministro do Reino Unido Gordon Brown, o ex-presidente da Colômbia Juan Manuel Santos, a ex-presidente da Libéria Ellen Johnson Sirleaf, o ex-presidente da França François Hollande e o professor Joseph Stiglitz e o professor Francoise Barre-Sinoussi, pediram hoje ao presidente Biden para apoiar uma renúncia às regras de propriedade intelectual para as vacinas contra a COVID-19 e buscar uma vacina popular para acabar com a pandemia em uma carta aberta hoje.
A carta foi enviada à Casa Branca quando as autoridades sanitárias americanas aconselharam uma pausa no uso da vacina contra a COVID-19 da fabricante Johnson & Johnson. Uma renúncia às regras de propriedade intelectual permitiria uma maior escala na fabricação nos EUA e em todo o mundo, superando as restrições artificiais de fornecimento.
As ex-lideranças mundiais, ganhadoras e ganhadores do Prêmio Nobel encorajam o Presidente Biden a tomar a ação urgente que só ele pode e “que este momento seja lembrado na história como o momento que escolhemos para colocar o direito coletivo e a segurança para todas as pessoas à frente dos monopólios comerciais de poucas.”
A carta pede especificamente ao Presidente Biden para apoiar uma proposta dos governos sul-africano e indiano na Organização Mundial do Comércio (OMC) para renunciar temporariamente às regras de propriedade intelectual relacionadas às vacinas e tratamentos para COVID-19. No ritmo atual de produção de vacinas, a maioria das nações pobres ficará esperando até pelo menos 2024 para conseguir a imunização em massa da COVID-19.
Gordon Brown, ex-Primeiro Ministro do Reino Unido, disse:
“O Presidente Biden disse que ninguém está em segurança até que todas as pessoas estejam seguras, e agora com o G7 à frente há uma oportunidade sem igual de promover a liderança que somente os EUA podem proporcionar e que acelera o fim da pandemia para o mundo.”
“Uma renúncia temporária urgente das regras de propriedade intelectual na Organização Mundial do Comércio nos ajudaria a aumentar o fornecimento global de vacinas, juntamente com um plano global de compartilhamento de encargos de vários anos para financiar vacinas para os países mais pobres.”
“Isto seria do interesse estratégico dos EUA e de todos os países do planeta”.
Joseph Stiglitz, ganhador do Prêmio Nobel de Economia, disse:
“Os EUA tiveram enormes progressos na vacinação de sua própria população, graças aos esforços da administração Biden. Infelizmente, só isso não é suficiente.”
“Novas mutações do vírus continuarão a custar vidas e a elevar nossa economia global interligada até que todas as pessoas, em todos os lugares, tenham acesso a uma vacina segura e eficaz. A propriedade intelectual é a maior barreira artificial para o fornecimento global de vacinas. Nós, como nação, devemos liderar com nossas alianças para apoiar a renúncia da África do Sul e da Índia na OMC, insistir na transferência de tecnologia, e investir estrategicamente na produção”.
François Hollande, ex-presidente da França, disse:
“A extrema desigualdade no acesso às vacinas em todo o mundo cria uma situação política e moral insuportável. É acima de tudo um disparate sanitário e econômico, como todos nós estamos preocupados. O fato de o governo Biden estar considerando a possibilidade de renunciar às barreiras relacionadas às regras de propriedade intelectual oferece esperança para a comunidade internacional. Se os Estados Unidos apoiarem o levantamento de patentes, a Europa terá que assumir suas responsabilidades. Diante desta pandemia devastadora, as lideranças mundiais devem priorizar o interesse público e a solidariedade internacional”.
Outras pessoas signatárias incluem Mary Robinson, ex-presidente da Irlanda, Fernando Henrique Cardoso, ex-presidente do Brasil, e Helen Clark, ex-primeira-ministra da Nova Zelândia, juntamente com mais de 60 outros ex-chefes de estado e chefes de governo que abrangem todos os continentes.
As lideranças também pediram que a renúncia à propriedade intelectual fosse acompanhada pelo compartilhamento aberto de conhecimento e tecnologia de vacinas, e pelo investimento global coordenado e estratégico em pesquisa, desenvolvimento e capacidade de fabricação, especialmente em países em desenvolvimento, ressaltando que as ameaças à saúde pública são globais e exigem soluções baseadas na solidariedade global.
Estas ações expandiriam a capacidade de fabricação global, sem os impedimentos dos monopólios da indústria, que estão provocando a terrível escassez de oferta bloqueando o acesso às vacinas. A desigualdade de vacinas resultante, alertaram as lideranças, significa que a economia dos EUA já corre o risco de perder US$1,3 trilhão no PIB este ano, e se o vírus seguir circulando pelo mundo, o aumento do risco de novas variantes virais significa que até mesmo pessoas vacinadas nos EUA poderiam ficar desprotegidas mais uma vez.
A carta, que foi coordenada pela People’s Vaccine Alliance (Aliança pela Vacina Popular, na tradução livre para o português), uma coalizão de mais de 50 organizações incluindo o Club de Madrid, Health GAP e UNAIDS, advertiu que, na atual taxa global de imunização, era provável que apenas 10% das pessoas na maioria dos países pobres fossem vacinadas no próximo ano.
Françoise Barré-Sinoussi, Prêmio Nobel de Fisiologia ou de Medicina, disse:
“Não acabaremos com a pandemia global de hoje até que os países ricos – especialmente os Estados Unidos – deixem de bloquear a capacidade dos países do mundo inteiro de produzir em massa vacinas seguras e eficazes.”
“A saúde global está em jogo. A história está de olho. Eu, com meus e minhas colegas laureados e cientistas em todo o mundo, convoco o Presidente Biden a fazer a coisa certa e a apoiar a renúncia ao Acordo TRIPS, insisto em que as corporações farmacêuticas compartilhem tecnologias de vacinas com o mundo e invistam estrategicamente na produção distribuída.”
Muhammad Yunus, ganhador do Prêmio Nobel da Paz, disse:
“Grandes empresas farmacêuticas estão estabelecendo os termos do fim da pandemia de hoje – e o custo de permitir monopólios sem sentido é apenas mais morte e mais pessoas sendo empurradas para a pobreza.”
“Precisamos de uma forte ação governamental para liderar – não apenas a filantropia e o setor privado – para resolver a crise sem precedentes de hoje. De forma conjunta, convocamos o Presidente Biden a estar do lado certo da história – e assegurar que uma vacina seja um bem comum global, livre de proteções de propriedade intelectual”.
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Notas:
A carta completa e a lista de pessoas signatárias pode ser encontradas aqui.
A carta foi coordenada pela People’s Vaccine Alliance, uma coalizão de mais de 50 organizações incluindo o Club de Madrid, o Centro Yunus, Oxfam, Health GAP, UNAIDS, Physicians for Human Rights, o Centro Internacional Nizami Ganjavi, Global Justice Now e Avaaz.