Como parte semana de celebrações do Dia Internacional de Enfrentamento à LGBTIfobia (IDAHOT, da sigla em inglês), comemorado mundialmente todo dia 17 de maio, o UNAIDS foi convidado para participar, nesta quarta-feira (15/5), de audiência pública realizada no âmbito da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados, em Brasília, destinada a debater os projetos de lei voltados para a efetivação da igualdade de direitos e proteção jurídica da população LGBTI+.
Além do diretor interino do UNAIDS no Brasil, Cleiton Euzébio de Lima, participaram do debate deputados, sociedade civil, academia, Ministério Público Federal e Defensoria Pública da União. A celebração do Dia Internacional contra a Homofobia, a Transfobia e a Bifobia acontece desde que a Organização Mundial da Saúde (OMS) retirou a homossexualidade da lista de distúrbios mentais, em 17 de maio de 1990. A data já recebeu reconhecimento oficial de vários Estados, instituições internacionais como o Parlamento Europeu e inúmeras autoridades locais, incluindo as agências das Nações Unidas.
Durante a audiência, o diretor interino do UNAIDS mencionou que, em cerca de um terço dos países do mundo, as relações entre pessoas mesmo sexo são criminalizadas e que a violência LGBTfóbica ainda é muito presente no Brasil. “No Brasil, ser LGBTI+ não é crime, não há nenhuma lei que criminalize as relações entre pessoas do mesmo sexo”, diz Lima. “No entanto, todos os anos, centenas de pessoas LGBTI+ são assassinadas no Brasil, o que coloca o país como campeão no assassinato de pessoas trans em todo o mundo, de acordo com a ONG Transgender Europe.”
“Apesar da violência LGBTfóbica ser a face mais grave da LGBTfobia, ela também tem impacto em outras áreas da sociedade. Na economia, a homofobia tem um custo muito alto pros países”, afirma Lima. “O UNAIDS calcula que 7,6 bilhões de dólares são perdidos na América Latina por ano por conta da homofobia.”
Segundo o relatório do UNAIDS, Lacuna na Prevenção (2016), a quantificação do custo da homofobia reforça a importância de leis e políticas inclusivas como parte dos esforços para melhorar o desenvolvimento econômico e social. O custo da homofobia é calculado a partir de aspectos de discriminação institucional (legislação) e social (aceitação da diversidade sexual), e considera perdas relacionadas à produtividade (desemprego) e ao impacto na saúde (saúde mental, física, morte por crime de ódio). O custo da homofobia no Brasil, em relação ao PIB, é maior, por exemplo, do que no Uruguai, Argentina e México.
O diretor interino do UNAIDS também destacou o impacto do estigma e da discriminação no acesso da população LGBTI+ aos serviços de saúde. “A discriminação é uma das principais barreiras da população LGBTI+ no acesso à saúde”, disse. “Em muitos serviços de saúde, pessoas LGBTI+ enfrentam dificuldades de conseguir acesso a serviços de saúde de qualidade e livres de discriminação, o que torna essa população mais vulnerável a questões de saúde, como o HIV. Convido as senhoras e senhores parlamentares que se somem a essa iniciativa para construirmos serviços de saúde livres de discriminação no SUS.”
A realização da audiência pública foi solicitada pelo deputado Túlio Gadelha (PDT-PE) e presidida pelo deputado Helder Salomão (PT-ES), presidente da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados, que afirmou durante o encontro que “esta é uma data de luta, de apresentar à sociedade o grave problema de violência e discriminação que uma parcela da comunidade brasileira e mundial sofre diuturnamente.”
Os deputados Camilo Capiberibe (PSB-AP), Eli Borges (SD-TO), Abílio Santana (PR-BA) Tereza Nelma (PSDB-AL), Bia Cavassa (PSDB-MS) e David Miranda (PSOL-RJ) também participaram da audiência.
Entre os convidados para compor a mesa estavam também Toni Reis, diretor presidente da Aliança Nacional LGBTI+, Sérgio Gardenghi Suiama, procurador da República e coordenador do Grupo de Trabalho Direitos Sexuais Reprodutivos da Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC) do Ministério Público Federal, Carolina Casteliano, coordenadora do Grupo de Trabalho Identidade de Gênero e Cidadania LGBTI da Defensoria Pública da União, Marina Reidel, representando o Conselho Nacional de Combate à Discriminação e Promoção dos Direitos de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais, Maria do Céu de Ataíde, representante do Instituto Boa Vista de Pernambuco, e Tatihane Aquino de Araújo, presidente da Rede Nacional de Pessoas Trans do Brasil.
Durante a audiência, o diretor presidente da Aliança Nacional LGBTI+ afirmou que “os projetos prioritários são os que dizem respeito ao direito à identidade de gênero, à criminalização da homofobia, ao uso do banheiro por pessoas trans de acordo com a identificação delas, além dos estatutos da diversidade e das famílias”, diz Toni Reis.
Sérgio Gardenghi Suiama, destacou que o compromisso do Ministério Público é a afirmação dos direitos fundamentais da pessoa na perspectiva dos direitos coletivos. “Temos atuado há quase 20 anos na defesa dos direitos LGBTI+”, disse. “Há um reconhecimento que a comunidade LGBTI+ sofre uma violência que demanda uma proteção, que deve ser feita de várias maneiras, inclusive dentro do sistema penal.”
A presidente da Rede Nacional de Pessoas Trans do Brasil apresentou o trabalho de incidência da Rede, que tem como objetivo resgatar a cidadania da população trans que vive ceifada de diversos direitos. “Três anos atrás, fomos a primeira instituição brasileira a promover a coleta qualificada e disponibilizada para toda a sociedade sobre os assassinatos de pessoas trans”, relembrou Tathiane Aquino. Segundo ela, a maioria dos casos de morte da população trans acontece na rua e durante a noite.
LGBTI+ e HIV no Brasil
Segundo dados do Grupo Gay da Bahia, apresentados durante a audiência pública, a cada 19 horas, uma pessoa LGBTI+ é assassinada no Brasil. A cada duas horas, acontece uma agressão. Nesse contexto, a expectativa de vida das pessoas trans é de 35 anos. O Congresso Nacional Brasileiro não aprova leis protetivas para a população LGBTI+ há 31 anos, desde a Constituição de 1988.
De acordo com o Ministério da Saúde, as taxas de detecção de casos de AIDS no Brasil cresceram substancialmente entre homens jovens na última década—especialmente entre gays e outros homens jovens que fazem sexo com homens. Estima-se que 18% e 31% das travestis e pessoas trans no Brasil estejam vivendo com HIV. Entre homens gays e outros HSH, a prevalência é de quase 20%. Números recentes do estado de São Paulo mostram uma prevalência de HIV de 15% entre gays e HSH. Na população em geral, prevalência do HIV é de 0,4%.
No mundo, segundo o UNAIDS, as populações-chave e seus parceiros sexuais representam 47% das novas infecções pelo HIV em todo o mundo e o risco de infecção pelo HIV é: 28 vezes maior entre homens que fazem sexo com homens do que na população em geral; 22 vezes maior entre pessoas que usam drogas injetáveis; 13 vezes maior entre profissionais do sexo e 13 vezes maior entre mulheres trans.
CITAÇÕES
“O Grupo de Trabalho Identidade de Gênero e Cidadania LGBTI+ da DPU tem como objetivo garantir e promover direitos desta população, de forma judicial ou extra-judicial, individual ou coletiva. Um exemplo é a ação que a DPU ingressou no ano passado para determinar que o IBGE inclua o mapeamento da população transexual no próximo censo, como primeiro passo para a construção de política públicas.”
Carolina Casteliano, coordenadora do Grupo de Trabalho Identidade de Gênero e Cidadania LGBTI+ da Defensoria Pública da União
“Lutamos por nossa existência e nosso amor. Precisamos amar e viver. É nesse sentido que o conselho tem se debruçado nos últimos anos. Já construímos muita coisa e estamos debatando essa semana para pois precisamos continuar nessa luta.”
Marina Reidel, representando o Conselho Nacional de Combate à Discriminação e Promoção dos Direitos de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais