Entre os cerca de 800 habitantes da Praia do Contrato, no município de Igrapiúna, no sul da Bahia, um menino, filho de pai pescador e mãe marisqueira, sonhava em descobrir a cura da AIDS. E para isso, precisava tornar real o seu sonho de fazer faculdade e escrever uma história diferente daquela que parecia estar traçada para ele dentro de seu povoado. Todos os dias, Vinícius Nascimento cumpria religiosamente um trajeto de mais de cinco horas para ir e voltar da escola—quatro de barco e mais de uma hora de ônibus—,chegando de volta a sua casa só à noite, depois das 20:00.
Nesse percurso, chegou a pensar que seria professor de matemática, mas a afinidade com a biologia falou mais alto. E a vontade de ser médico veio como consequência, depois que começou a estudar enfermagem em Feira de Santana, já distante de seus pais. Decidiu que seria melhor trancar a faculdade por seis meses para se dedicar ao vestibular de medicina e, aos 21 anos, quando passou na prova, mudou-se para Salvador.
Cinco anos depois, aos 26, Vinícius começa a escrever um novo capítulo da sua trajetória: no dia 19 de julho, ele embarca para Amsterdã, na Holanda, para participar da Conferência Internacional de AIDS 2018. O estudante de medicina foi o vencedor do concurso Fase 2 do #DesafioUNAIDS, realizado pelo escritório do UNAIDS no Brasil em parceria com a Embaixada dos Países Baixos, em Salvador.
“Eu sempre tive vontade de participar da Conferência internacional de AIDS, mas por questão financeira nunca foi possível. Ver esse desejo tornar-se concreto é uma oportunidade ímpar”, conta o estudante, que fará sua primeira viagem ao exterior.
As barreiras enfrentadas ao longo de sua trajetória como estudante nunca o fizeram desistir da medicina. Paralelamente aos estudos, começou a se envolver com trabalhos de prevenção e educação sexual e reprodutiva na universidade, com jovens da periferia de Salvador.
“Eu acabei assimilando o interesse pela temática do HIV e pesquisando mais sobre o assunto”, explica Nascimento. “O interesse em trazer o debate sobre sexualidade para a população universitária surgiu por perceber que muitos dos meus colegas não tinham conhecimentos básicos sobre esses temas relacionados ao HIV.”
A oportunidade de participar do concurso do Fase 2 do #DesafioUNAIDS, aliada a sua experiência como ativista, deu vida ao projeto Simbora: um papo reto sobre saúde, prevenção e cuidado, que tem como objetivo promover rodas de conversa, livres de estigma e discriminação, para garantir acesso à informação sobre prevenção para pessoas em diversos contextos sociais.
“Prevenção e conhecimento partem também do autocuidado, do ‘se conhecer’ e ‘se ver’ como vulnerável, assim como qualquer outra pessoa que faz sexo”, explica o estudante. “O Simbora foi construído com a finalidade de garantir aos jovens da UNEB (Universidade Estadual da Bahia) e também da população vizinha, acesso a esse tipo de debate, de forma descontraída e bem informada.”
Com a data da viagem para Amsterdã se aproximando, Nascimento diz que o frio na barriga e a ansiedade para sua participação na Conferência Internacional de AIDS 2018 também crescem. “É uma grande oportunidade de participar de discussões em um sentido social e científico, além de agregar na minha formação como profissional. Acredito que vou absorver muitas ideias para construir pontes e quebrar barreiras que ainda existem, e que dificultam o acesso aos serviços de saúde”, conta Vinícius.
Han Peters, Embaixador dos Países Baixos no Brasil, lembra que, desde o início da epidemia, a Holanda tem sido um dos países influentes na resposta ao HIV e que recursos e informações adequados são ferramentas fundamentais na prevenção.
“A Conferência em Amsterdã acolherá todas as populações para participar dos debates e tem convocado também a participação da geração mais nova de profissionais e ativistas”, diz o Embaixador. “Estamos muito felizes que haverá uma delegação brasileira ampla, composta de jovens, funcionários públicos, da sociedade civil e de membros do UNAIDS Brasil.”
Desafio UNAIDS
O #DesafioUNAIDS surgiu com o objetivo de engajar influenciadores digitais, seus seguidores e fãs nas redes sociais, para mostrar que nenhuma pergunta sobre HIV e sexualidade merece ficar sem resposta. E mais: provocar uma reflexão sobre como estamos debatendo questões tão importantes como essas na internet.
Depois de mobilizar quase 40 influenciadores e alcançar mais de 1,3 milhão de visualizações orgânicas, o UNAIDS criou uma segunda etapa, para tirar o #Desafio do mundo virtual e levá-lo para o mundo real, em projetos e ações concretas com a comunidade.
A Diretora do UNAIDS no Brasil, Georgiana Braga-Orillard, reforça a importância de envolver o jovem na resposta à epidemia, e que o investimento em juventude, como o feito pela Embaixada dos Países Baixos, é essencial.
“Quando cheguei ao Brasil em 2013, tínhamos a imagem de um país com uma resposta positiva e forte, mas percebi que não havia muito investimento no jovem. E temos feito isto com vários parceiros desde então”, explica. “Precisamos dos jovens para trazer ideias inovadoras e criativas, principalmente quando se trata de prevenção. Além disso, precisamos ouvir do jovem o que falta para que essa comunicação sobre prevenção realmente chegue a todo mundo.”