O UNAIDS e o Departamento de Doenças de Condições Crônicas e Infecções Sexualmente Transmissíveis (DCCI) do Ministério da Saúde reuniram secretários e secretárias municipais e estaduais de saúde, profissionais da gestão pública e especialistas na resposta ao HIV nos níveis municipal, estadual e federal para o evento Fast-Track Cities (Acelerando a resposta ao HIV nas cidades). O objetivo foi discutir avanços, desafios e soluções em torno dos compromissos da Declaração de Paris.
O documento, que já foi assinado por 42 cidades brasileiras, além do Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Distrito Federal, marca o comprometimento destas localidades com o cumprimento das metas de tratamento 90-90-90 para o HIV. Isso significa o compromisso de que, até 2020: 90% das pessoas vivendo com HIV estejam diagnosticadas; 90% das pessoas diagnosticadas estejam em tratamento antirretroviral; e que 90% destas pessoas em tratamento estejam com carga viral suprimida.
Este encontro, que reuniu representantes de 15 destas cidades e estados que assinaram a Declaração de Paris, foi realizado em São Paulo, nos dias 31/10 e 1/11. O evento marcou também a comemoração do Dia Internacional das Cidades, celebrado mundialmente pela ONU.
Os compromissos da Declaração de Paris ultrapassam as questões biomédicas relacionadas ao HIV e à AIDS. “Quando conseguimos avançar na resposta à epidemia do HIV, avançamos também em outros campos que vão além da área de saúde como, por exemplo, nas questões sociais”, disse Cleiton Euzébio de Lima, diretor interino do UNAIDS no Brasil. Por isso, durante o seminário, foram debatidos aspectos como populações-chave e direitos humanos, prevenção combinada do HIV, intersetorialidade e justiça social, parcerias com a sociedade civil, financiamento e compromisso político.
No primeiro dia, secretários e secretárias de saúde participaram de rodadas de apresentações e entrevistas ao redor dos três eixos das metas 90-90-90, que guiam a Declaração de Paris. As discussões tiveram foco nos avanços, experiências bem-sucedidas e compromissos para este último ano até o prazo final para o cumprimento destas metas.
O secretário municipal de Porto Alegre (RS), Pablo Stümer, exemplificou como a cidade tem trabalhado para diagnosticar o maior número possível de pessoa vivendo com HIV. “A nossa unidade móvel tem circulado com mais intensidade nos últimos anos, e com isso ofertado mais testagem. Além disso, temos levado o teste à população com ações em eventos e locais com alta circulação de pessoas. Pra colocar as pessoas no centro das ações, a gente precisa de uma rede articulada e chegar aonde elas estão”, disse o secretário.
Como um desafio que ainda precisa ser superado para chegar às metas, Stümer falou sobre a importância da qualidade de atendimento na atenção primária. “A atenção primária tem um papel chave na questão da testagem, e o nosso desafio é expandi-la cada vez mais. Precisamos ter uma cobertura efetiva, porque é na atenção primária que as pessoas têm sua referência de acompanhamento”, afirmou.
Para melhorar a adesão do paciente ao tratamento antirretroviral, que está relacionada ao segundo 90—ter 90% das pessoas vivendo com HIV em tratamento antirretroviral—, as cidades signatárias têm buscado aprimorar a qualidade do atendimento nas unidades de saúde. “Desde que aderimos à Declaração de Paris, temos conseguido potencializar as ações através de um trabalho junto à comunidade”, disse Waneska Barboza, secretária municipal de saúde de Aracaju (SE). “Temos tentado sensibilizar os profissionais da atenção básica para que absorvam os pacientes e, além de fazer o diagnóstico, já deem início ao tratamento, sem necessariamente ter que encaminhar para o centro especializado. Precisamos descentralizar para melhorar a adesão dos pacientes ao tratamento.”
Pela primeira vez, uma meta da ONU para o HIV buscou medir a qualidade do serviço prestado aos usuários e usuárias da saúde. Nas metas 90-90-90, o terceiro 90—que tem foco em garantir que as pessoas em tratamento antirretroviral estejam com carga viral indetectável—demonstra também, entre outras coisas, a capacidade dos serviços de saúde de serem acolhedores o suficiente para que a pessoa se mantenha em tratamento e consiga se manter indetectável.
“A adesão à Declaração de Paris veio reforçar o trabalho que a gente já vinha fazendo de aprimorar os nossos serviços especializados de atendimento às pessoas vivendo com HIV. Conseguimos melhorar esses serviços, aumentando o número de equipes multiprofissionais, o que garante adesão e continuidade dos pacientes ao tratamento”, disse secretário municipal de Belém (PA), Sérgio Figueiredo. “Atualmente, temos cerca de 80% dos pacientes em tratamento, e fazemos busca ativa para conseguir alcançar os outros 20%.”
Monitoramento e avaliação
O encontro também contou com compartilhamento de experiências focadas em monitoramento e avaliação do HIV e o papel fundamental dos dados e estatísticas para a construção de uma resposta mais efetiva à epidemia.
Além disso, foi feita uma rodada de experiências bem-sucedidas em alguns municípios signatários da Declaração de Paris com objetivo de inspirar participantes do encontro quanto à possibilidade de aplicação e adaptação destas ideias para suas localidades. Foram apresentados os projetos “Tudo de Bom” (São Paulo) e “Tô Dentro” (Viamão), além da experiência de Campinas com a mobilização da sociedade civil na resposta ao HIV e no cumprimento dos compromissos assumidos na Declaração.
O segundo dia de seminário contou com uma rodada de diálogos sobre linha de cuidado e gestão de serviços, além de um balanço final dos participantes sobre as discussões levadas ao evento.
“O engajamento da resposta ao HIV é fundamental, especialmente a nível local, para alcançarmos as metas 90-90-90 de aceleração da resposta à epidemia. O Brasil tem todos os instrumentos, todo o potencial para conseguir enfrentar esse desafio com sucesso, especialmente em um contexto de acesso universal à saúde”, destacou Clarissa Barros, analista técnica de políticas sociais do DCCI.
“Foram dois dias intensos de discussões políticas e programáticas que evidenciaram que não existe uma solução única para alcançar as metas 90-90-90, mas que essa conquista é possível quando há liderança política e comprometimento de todos”, concluiu o diretor interino do UNAIDS no Brasil.