Mensagem do Diretor Executivo do UNAIDS, Michel Sidibé
Uma luz brilhante da África faleceu. Um africano de coração e cidadão global, Kofi Annan simbolizava o melhor da humanidade. Ele era um revolucionário, um inovador e um solucionador de problemas.
Na virada do século, o negacionismo da AIDS estava no auge. Koffi Annan ajudou a quebrá-lo. “Mais pessoas morreram por causas relacionadas à AIDS na África no ano passado do que em todas as guerras no continente. A AIDS é uma grande crise para o continente, os governos precisam tomar uma atitude. Devemos acabar com a conspiração do silêncio e a vergonha colocada sobre essa questão,” disse ele.
Quando Annan iniciou seu mandato como novo Secretário-Geral das Nações Unidas em 1997, as perspectivas para a epidemia de AIDS eram desanimadoras—cerca de 23,9 milhões de pessoas viviam com HIV, houve 3,5 milhões novas infecções por HIV e o acesso ao tratamento capaz de salvar vidas estava disponível para apenas poucos privilegiados.
Ele, humildemente e diplomaticamente, instigou e convenceu líderes mundiais, e quando a mensagem não chegou, ele falou publicamente e energicamente. “Amigos, sabemos o que é preciso para reverter essa epidemia. Isso exige que todos os presidentes e primeiros-ministros, todos os parlamentares e políticos, decidam e declarem: ‘a AIDS para comigo’. A AIDS para comigo.” disse ele.
Sob sua liderança, em 2000, o Conselho de Segurança das Nações Unidas adotou a resolução 1308, identificando a AIDS como uma ameaça à segurança global. Em 2001, foi realizada a Sessão Especial da Assembleia Geral das Nações Unidas sobre HIV/AIDS—a primeira reunião de líderes mundiais sobre uma questão de saúde nas Nações Unidas.
Em 2000, numa época em que menos de US$ 1 bilhão estava sendo investido na resposta à AIDS, ele pediu um orçamento de pelo menos US$ 7–10 bilhões para a AIDS, a tuberculose e a malária. Essa convocação e seu lobby articulado de líderes mundiais levaram à criação do Fundo Global de Combate à AIDS, Tuberculose e Malária, que salvou milhões de vidas. Koffi Annan permaneceu como patrono do Fundo Global, ajudando a garantir que ele seja totalmente financiado.
O Objetivo de Desenvolvimento do Milênio de interromper e reverter a disseminação da AIDS e a Declaração de Compromisso das Nações Unidas sobre HIV/AIDS de 2001 estabeleceram metas de prevenção do HIV, mas não definiram metas concretas para o acesso ao tratamento. Na época, o custo dos medicamentos antirretrovirais era astronomicamente alto. Dialogando com a indústria farmacêutica, Koffi Annan ajudou a pavimentar o caminho para a eventual redução de preços. Quem acreditaria, em 2001, que o custo dos medicamentos antirretrovirais capazes de salvar vidas chegaria, até 2018, a US$ 60 por pessoa ao ano. Hoje, cerca de 21 milhões de pessoas estão em tratamento para o HIV.
Koffi Annan usou habilmente seu poder de convocar para o bem. Quando soube que menos de 30% das pessoas tinham conhecimento sobre o HIV, ele reuniu líderes da mídia e ajudou a lançar a Iniciativa Global de Mídia sobre AIDS. Como resultado, centenas de horas de programas de conscientização relacionados à AIDS foram veiculados gratuitamente por empresas de mídia pública e privada em todo o mundo. Koffi Annan até apareceu com um personagem vivendo com HIV em Vila Sésamo, ajudando a reduzir o estigma e a discriminação contra crianças afetadas pelo HIV.
Seu coração estava com as pessoas afetadas pelo HIV. Ele viu as realidades da epidemia do HIV em primeira mão. Ele sabia que a mudança acontece quando mulheres e meninas são empoderadas. “Isso requer mudanças reais e positivas que darão mais poder e confiança às mulheres e meninas e transformarão as relações entre mulheres e homens em todos os níveis da sociedade,” disse. “Isso requer mais recursos para as mulheres, leis melhores para as mulheres e mais espaços para as mulheres nas mesas de tomada de decisões. É preciso que todos vocês coloquem a luta contra a AIDS como uma prioridade pessoal, não apenas nesta sessão, ou neste ano, ou no próximo ano, mas em todos os anos até que a epidemia seja revertida.”
Ele abraçou a diversidade. Ele foi vocal sobre os direitos de profissionais do sexo, homens gays e outros homens que fazem sexo com homens, pessoas que fazem uso de drogas e pessoas trans. “Precisamos ser capazes de proteger os mais vulneráveis. Se estamos aqui para tentar acabar com a epidemia, não teremos sucesso se fingirmos que essas pessoas não existem ou que elas não precisam de ajuda,” disse. “Precisamos ajudá-los e precisamos resistir a qualquer tentativa de impedir o reconhecimento da necessidade de ação e assistência a essas pessoas.”
Koffi Annan tinha um lugar especial para o UNAIDS em seu coração. Ele reservou tempo para nós, manteve-se informado sobre o progresso alcançado na resposta à AIDS e doou os royalties do livro de discursos ‘Nós, os povos: uma ONU para o século vinte e um’ para o UNAIDS. Quatro semanas atrás, quando me encontrei com ele para almoçar, ele expressou felicidade com o quão longe chegamos, mas estava preocupado com a velocidade da resposta, que não está acompanhando a ambição que havíamos estabelecido.
Duas décadas atrás, ele definiu o impacto da AIDS como a maior reversão na história do desenvolvimento humano, o maior desafio de nossa geração. Lembro-me de suas palavras ao aceitar o Prêmio de Liderança do UNAIDS em 2016. “Hoje, vemos um grande progresso, mas a luta ainda não acabou. Devemos continuar e acordar todas as manhãs prontos para lutar e lutar novamente, até vencermos.”
No UNAIDS, prometemos que não descansaremos até que o fim da epidemia de AIDS seja alcançado. Nós devemos isso a ele.