O inverno de 2019/2020 em Wuhan, cidade na província de Hubei, região central da China, permanecerá com Xiao Yang pelo resto de sua vida. Durante 60 dias, trabalhando como enfermeiro em uma emergência de um hospital improvisado, ele vivenciou vida e morte, felicidade e tristeza, lágrimas e risadas.
Xiao se ofereceu para sair de sua cidade natal, pequim, e ir para Wuhan salvar vidas. “Salvar a vida é responsabilidade de todo profissional de saúde”, disse ele. Esse compromisso está profundamente enraizado em sua família—há 17 anos, seu pai trabalhava como médico na linha de frente da epidemia de Síndrome Respiratória Aguda Grave (SARS, na sigla em inglês).
Xiao não contou ao namorado que estava indo para Wuhan até o último minuto. “Ele não queria que eu fosse, mas respeitava minha decisão”, afirmou.
Na noite em que chegaram a Wuhan, os voluntários foram divididos em dois grupos—terapia intensiva e casos leves.
Xiao foi designado para tratamento intensivo. Para sua proteção, ele foi obrigado a usar cinco luvas e duas máscaras. No entanto, a maioria das luvas era pequena demais para ele e usá-las por mais de 20 minutos o machucava. Ele também achou difícil respirar. “Parecia que alguém estava cobrindo minha boca o tempo todo”, disse.
E era ainda pior para Xiao, pois ele é asmático. Se um ataque de asma ocorresse, ele não teria tempo de alcançar seu remédio por causa de todo o equipamento de proteção que estava usando.
“Todos nós, profissionais de saúde, gravamos as palavras finais para nossas famílias em nossos telefones”, disse ele.
Seu namorado, Lin Feng, é policial. Ele também ficou muito mais ocupado por causa da pandemia de COVID-19. Quando a COVID-19 estourou em Pequim, ele ficou de plantão por longas horas, inspecionando as rodovias, ruas e áreas residenciais.
Quando o casal estava distante, as mensagens instantâneas eram a única maneira de se comunicar. Coberto de neve depois de terminar o turno da noite, ele recebia mensagens de texto de Xiao lembrando-o de vestir roupas mais grossas. E sua resposta era: “Você cuida de seus pacientes. Eu cuidarei de você.”
Seis dias após sua chegada a Wuhan, Xiao percebeu que a morte poderia estar próxima.
Ao percorrer a enfermaria, ele viu um paciente sofrendo uma drástica queda no nível de oxigênio no sangue e falta de ar. Ele correu para intubá-lo, pois era a maneira mais rápida e eficaz de mantê-lo vivo. Ele agiu com muita forç e seu traje de proteção rasgou nas costas. Um colega tampou o buraco para que ele pudesse continuar trabalhando.
Depois que o paciente foi estabilizado, Xiao mal conseguia respirar e sentia dores agudas nas mãos, ouvidos e rosto. Ele estava usando máscaras, luvas e seu traje de proteção por muito tempo. Quando a dor diminuiu, o medo tomou conta dele. Aquele rasgo no seu traje de proteção poderia facilmente tê-lo infectado com coronavírus. O rompimento também o fez lembrar dos riscos que enfrentava todos os dias. “Só posso rezar para ficar bem”, disse ele. “Eu estava preparado para o pior quando decidi vir aqui.”
Há muitas pessoas da comunidade de lésbicas, gays, bissexuais, transgêneros e intersex, como Xiao e Lin, que trabalharam duro para conter o vírus e salvar vidas durante a pandemia. No Centro de Lésbicas, Gays, Bissexuais e Transgêneros de Wuhan, 26 voluntários trabalharam sem parar para entregar remédios a pessoas vivendo com HIV. O UNAIDS orgulha-se de apoiar esses esforços, conectando as organizações às autoridades de saúde locais para facilitar a entrega de remédios, ajudando na entrega de remédios para chineses que vivem com HIV no exterior e apoiando o a criação de uma linha direta de serviços para aconselhamento de pessoas que vivem com HIV. Como resultado, o centro conseguiu entregar remédios para mais de 2600 pessoas e a linha direta atingiu cerca de 5500 pessoas.
“Foi planejado que eu ficaria uma semana, mas depois estenderam para três semanas e foram estendendo cada vez mais”, disse Xiao, contendo suas lágrimas.
Ele finalmente partiu no início de abril, quando a pandemia de COVID-19 desapareceu na cidade. Ele disse que vai se lembrar de tudo, mas não quer reviver isso. Ninguém deveria.
Agora de volta em segurança com o namorado em Pequim, ele lembrou das palavras do capitão em seu voo para Wuhan: “O voo é de Pequim para Pequim, com uma escala em Wuhan. Quando vocês vencerem a batalha, nós os levaremos de volta para casa”.
*Foto ilustrativa.