Na fronteira entre o Sudão do Sul e a República Democrática do Congo, Haut-Mbomou é a província mais impactada pelo HIV na República Centro-Africana, com a prevalência do vírus em 11,9%, em comparação com uma média nacional de 4%.
Inicialmente poupada pelo conflito que atingiu o país em 2013 e 2014, desde 2018 Haut-Mbomou tem sido cenário de combates entre grupos armados rivais, insegurança contínua e um deslocamento de pessoas em grande escala. Mais de 47 mil pessoas foram deslocadas por insegurança e violência, aumentando a população de cerca de 3.500 refugiados do Sudão do Sul e da República Democrática do Congo.
Alertados por relatos de falta persistente de medicamentos, atendimento precário a pessoas vivendo com HIV e barreiras ao acesso aos serviços de saúde e HIV devido à insegurança, uma missão conjunta do Ministério da Saúde da República Centro-Africana, Conselho Nacional de AIDS, Organização Mundial da Saúde, Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados e UNAIDS visitaram Haut-Mbomou de 8 a 12 de abril. Localizada a 1.000 km da capital Bangui, a província é uma das mais carentes em serviços sociais e de saúde. Metade dos serviços de saúde da província estão fechados devido à falta de profissionais ou instalações degradadas.
Nas cidades de Obo e Zemio, a missão reuniu-se com autoridades locais, prestadores de cuidados de saúde, líderes religiosos e comunitários, pessoas deslocadas internamente, refugiados e pessoas vivendo com HIV. “Esta missão conjunta reúne a amplitude da experiência nacional e das Nações Unidas para oferecer soluções práticas para os desafios do HIV e de saúde nesta província essencial”, disse Patrick Eba, Diretor do UNAIDS na República Centro-Africana.
A missão observou o impacto da insegurança na população, no acesso à saúde e outros serviços. As principais rotas de abastecimento estão fechadas e a violência fora dos centros urbanos limita muito o acesso aos medicamentos, alimentos e outros produtos essenciais.
O Hospital Distrital de Obo, o principal serviço de saúde da província, não possui equipamento básico de testes laboratoriais, incluindo para segurança do sangue ou detecção de tuberculose. O acesso a medicamentos antirretrovirais é bastante limitado por esgotamentos regulares. A ausência de contagem de CD4, testes de carga viral e outros testes biológicos para pessoas em terapia antirretroviral limita a qualidade dos cuidados para a população nacional e refugiados. A missão também se preocupou com a ausência de esforços de prevenção e sensibilização do HIV, incluindo a indisponibilidade de preservativos.
“Como podemos viver com dignidade quando enfrentamos desabastecimentos constantes de terapia antirretroviral e os profissionais de saúde nos tratam mal? Muitas pessoas em tratamento estão doentes com infecções oportunistas, mas o hospital não pode nos dar nada”, lamentou uma frágil mulher de meia-idade vivendo com HIV em Obo, que também se manifestou bravamente contra a discriminação.
O acesso à alimentação é um problema cada vez maior porque a insegurança limita a agricultura, a pesca e a caça e dificulta a capacidade das agências humanitárias de fornecer apoio nutricional. Para as pessoas vulneráveis que vivem com HIV, incluindo refugiados e pessoas deslocadas, o acesso a alimentos e apoio nutricional é essencial para a adesão e eficácia dos medicamentos antirretrovirais.
Em Zemio, a missão conversou com membros de grupos comunitários estabelecidos pelo Médicos Sem Fronteiras como parte de um programa inovador para facilitar o acesso a medicamentos antirretrovirais. Os líderes do grupo coletam e distribuem medicamentos antirretrovirais para os membros que moram longe dos hospitais. Os participantes do grupo destacaram que as barreiras ao acesso de medicamentos incluem obstáculos nas estradas, insegurança e extorsão por grupos armados. A missão realizou um diálogo com as comunidades e líderes do principal grupo armado de Zemio para enfatizar a necessidade de acesso irrestrito aos serviços de saúde.
A missão mostrou a natureza complexa dos desafios enfrentados pela resposta ao HIV em um contexto como o da República Centro-Africana, que é caracterizado pela insegurança, deslocamento da população e um sistema de saúde em colapso. Esses desafios exigem atenção e ação urgentes por parte do governo, das Nações Unidas e de outros países para enfrentamento de desafios emergentes e crônicos de saúde e de HIV. “Enfrentar esses desafios é essencial para mostrar que essas populações não estão esquecidas”, disse Wilfrid Sylvain Nambei, Ministro Coordenador do Conselho Nacional de AIDS. “A ação rápida após esta missão reforçará a confiança no governo e em seus parceiros e promoverá nossos esforços para construir a paz, a reconciliação e a reconstrução em não deixar ninguém para trás.”