Carta Para Além dos Muros reconstrói a trajetória do HIV e da AIDS, com foco no Brasil, por meio de entrevistas com médicos, ativistas, pessoas vivendo com HIV e diversos outros atores, além de farto material de arquivo. Do pavor inicial às campanhas de conscientização, passando pela discriminação imposta aos doentes, o documentário mostra como a sociedade encarou essa epidemia devastadora ao longo de duas décadas. Com base nessa abordagem histórica, o filme trata do modo como o HIV é encarado na sociedade atual, revelando um quadro de desinformação e discriminação persistentes, que atingem sobretudo as populações mais vulneráveis.
O documentário investiga o porquê da evolução no tratamento do HIV não vir acompanhada da mudança de mentalidade em relação à infecção. Um dos depoimentos retratados no filme, da imunologista Márcia Rachid, resume bem este desafio: “falar de HIV hoje tem o mesmo mistério de 35 anos atrás. Não pode!”.
André Canto, o diretor, entrevistou especialistas, pessoas que vivem com HIV, personalidades e autoridades. Estão no documentário nomes como os ministros da saúde que foram chave para que o Brasil se tornasse uma referência na resposta à epidemia, José Serra e José Gomes Temporão; os médicos Dráuzio Varella, Ricardo Tapajós, Ricardo Vasconcelos e Rosana Del Bianco; a apresentadora Marina Person; Lucinha Araújo, mãe de Cazuza, além de jovens que se tornaram a nova voz desta epidemia, entre tantos outros entrevistados, incluindo o autor deste blog.
“Contar a história da epidemia de aids significa tocar nos medos e nas memórias soterradas de pelo menos duas gerações. Dezenas de milhões de pessoas chegaram à vida adulta no Brasil dominadas pelo pavor de serem infectadas pelo HIV. Os gays viveram um medo duplo, tanto pela doença, que no início os afetava quase que exclusivamente, quanto pela discriminação que já sofriam. Uma combinação que só contribuiu para aumentar ainda mais o clima de incompreensão acerca do HIV”, explica Canto.
“Apesar de todos os avanços no tratamento e no entendimento da doença, muito desse medo e dessa incompreensão ainda persiste. O filme não é um trabalho psicanalítico, nem um relatório informativo sobre o HIV e a aids. Ele se propõe a ser um estopim, para tocar algo que permanece inconsciente no espectador, para mobilizá-lo, para instigá-lo a uma reflexão importante e incontornável sobre o HIV em nossa sociedade, para provocar uma mudança de postura e perspectiva sobre a história da aids e sobre a realidade atual do HIV”, conclui o diretor.