Inovação nos diagnósticos do HIV é urgente e necessária se o mundo quiser alcançar a meta 90-90-90 para o acesso à terapia antirretroviral. É o que recomendam os principais pesquisadores da área.
A convocação para um esforço intensificado e para inovações no diagnóstico do HIV ocorreu durante a 8ª Conferência da Sociedade Internacional de AIDS sobre Patogênese, Tratamento e Prevenção de HIV, realizada em Vancouver, no Canadá (22/07).
“Está evidente que não podemos aceitar o mesmo de sempre quando se trata dos diagnósticos de HIV”, disse o Diretor Executivo Adjunto do UNAIDS, Luiz Loures, que moderou uma sessão especial via satélite sobre a melhoria do acesso ao diagnóstico. “Temos de fazer as coisas de forma diferente, se quisermos alcançar a meta 90-90-90”.
Os especialistas mundiais dizem que as inovações devem se focar em três principais desafios do diagnóstico: garantir o diagnóstico precoce entre as crianças, aumentar rapidamente o conhecimento do estado sorológico para o HIV entre os adultos vivendo com o vírus e intensificar os exames de monitoramento da carga viral. Estas são as prioridades-chave da Iniciativa de Acesso aos Diagnósticos, uma iniciativa global que pretende aproveitar o potencial da medicina laboratorial para estabelecer as bases para acabar com a epidemia de AIDS como uma ameaça à saúde pública.
“Está evidente que não podemos aceitar o mesmo de sempre quando se trata dos diagnósticos de HIV” – Luiz Loures
Diagnóstico de crianças vivendo com HIV
Ao contrário dos adultos, que podem ser diagnosticados com HIV por meio de um simples teste de anticorpos, as crianças muito jovens exigem exames moleculares mais caros, que utilizam laboratórios centralizados e geralmente distantes das instalações clínicas. Isso cria atrasos substanciais no diagnóstico de crianças expostas ao HIV e também aumenta tanto os custos quanto os riscos de as amostras ou os resultados serem perdidos.
Mesmo quando os serviços de diagnóstico infantil precoce estão disponíveis, muitas crianças expostas ao HIV só recebem seus resultados do teste de HIV após o momento em que o pico da mortalidade ocorre, de seis a oito semanas de idade, de acordo com Trevor Peter, da Iniciativa Clinton Health Access (CHAI).
Exames locais relativamente simples para o diagnóstico infantil precoce estão surgindo agora, relatou Peter, e estes terão de ser rapidamente ampliados. Além disso, as tecnologias móveis de saúde têm o potencial de reduzir os atrasos na comunicação dos resultados dos exames e ajudar a garantir que os resultados para crianças expostas ao HIV sejam efetivamente recebidos nas instalações clínicas.
Na conferência de Vancouver, o UNAIDS e seus parceiros na Iniciativa de Acesso aos Diagnósticos anunciaram com a Roche Diagnostics um declínio de 35% no preço mundial para o diagnóstico infantil precoce.
Conhecimento do estado sorológico
O UNAIDS patrocinou uma sessão paralela à Conferência sobre a democratização do teste de HIV para alcançar a meta 90-90-90. Joseph Amon, da Human Rights Watch, advertiu que todas as pessoas devem se sentir habilitadas para escolher onde, quando e como querem ser testadas para o HIV. Consistente com esta abordagem de direitos humanos, há um interesse crescente em ferramentas de autotestagem para o HIV.
Novas diretrizes internacionais sobre serviços de testagem do HIV, anunciadas pela Organização Mundial de Saúde (OMS) também durante a Conferência de Vancouver, indicam que a OMS prevê o acesso generalizado à autotestagem como um componente importante de um esforço abrangente de testagem para o vírus da AIDS. Vários países, em diferentes regiões, permitem atualmente a autotestagem para o HIV, mas a maioria dos países ainda têm de adaptar suas leis e marcos regulatórios para permiti-la.
No Brasil, a autotestagem, usando o fluido oral, ainda aguarda aprovação da Agência de Vigilância Sanitátia (Anvisa). Mas um projeto-piloto, apoiado pelo UNAIDS, já commeçou a mostrar resultados importantes nesta área: é o projeto A Hora é Agora, em Curitiba. Lançado em novembro de 2014, visando a expansão da testagem rápida e gratuita anti-HIV entre as populações mais vulneráveis à infecção – jovens gays e outros homens que fazem sexo com homens (HSH) -, o projeto faz uso de abordagens inovadoras junto à população-alvo, entre elas a testagem rápida móvel em trailers equipados com laboratórios; no Grupo Dignidade – organização não governamental de promoção dos direitos de lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transgêneros (LGBTI+) –; pela plataforma virtual www.ahoraeagora.org, lançada em fevereiro deste ano; e pelo aplicativo criado especificamente para o projeto, disponível gratuitamente nas plataformas Android e IOS.
Mais de dois mil testes foram entregues entre fevereiro e agosto de 2015, somente em resposta a pedidos realizados pelo website do projeto. Destes, 70% foram de homens que fazem sexo com homens, dos quais 44% fizeram o teste pela primeira vez na vida. Por dia, em média, mais de 70 pessoas pedem o kit de testagem para o HIV.
As novas diretrizes da OMS sobre autotestagem para o HIV enfatizam a importância de deslocar o acesso aos testes para mais perto das comunidades. Em particular, as novas diretrizes recomendam medidas para permitir que pessoas leigas possam administrar os testes de HIV.
John Stover da Avenir Health acredita que o conhecimento do estado sorológico para o HIV por 90% das pessoas em uma comunidade é alcançável de forma mais ampla através de uma combinação de estratégias de testagem, tais como: testes de iniciativa dos prestadores de serviços de saúde em diversos contextos; inclusão das populações-chave; centros fixos para a testagem do HIV e aconselhamento; além de diversas abordagens com foco nas comunidades, tais como autoteste de HIV, testes móveis e os esforços na base domiciliar, ou seja porta a porta.
“Temos de fazer as coisas de forma diferente, se quisermos alcançar a meta 90-90-90” – Luiz Loures
Exames de carga viral
Os participantes da conferência também ouviram apelos urgentes para expandir o acesso a exames de carga viral. Não só o acesso a exames de carga viral é essencial para monitorar a meta 90-90-90, mas ele também é uma ferramenta clínica essencial para detectar a falha do tratamento precoce e permitir intervenção para melhorar a adesão ao tratamento. No entanto, as projeções da CHAI indicam que as tendências atuais na assimilação e implementação de exames de carga viral são insuficientes para garantir a concretização da meta 90-90-90.
Durante as sessões focadas em diagnóstico, vários caminhos novos foram sugeridos para reduzir essa lacuna. Parceiros da Iniciativa de Acesso aos Diagnósticos, juntamente com o Governo da África do Sul, concluíram no ano passado um acordo com a Roche Diagnostics para reduzir o preço do teste de carga viral em 40% em todo o mundo. Além disso, medidas precisam ser tomadas para maximizar o uso efetivo das plataformas de carga viral que existem atualmente, já que muitas tecnologias nesta área são gravemente subutilizadas no momento.