“Podemos vencer a guerra contra este vírus”, diz Yana Panfilova na abertura da Reunião de Alto Nível das Nações Unidas sobre AIDS

Originalmente publicado no site do UNICEF.

Meu nome é Yana. Sou da Ucrânia, tenho 23 anos de idade e nasci com HIV.

Acredito que todas as pessoas nascem livres. Mas a má legislação e o estigma social nos dão rótulos. Eu fui rotulada como uma pessoa vivendo com HIV. A sociedade decidiu como me vê e se vou viver ou morrer.

Quando eu tinha 10 anos, eu já tinha AIDS. Comecei a tomar um comprimido todos os dias que salvou a minha vida. E hoje esta pequena pílula mágica está salvando a vida de 27 milhões de pessoas que vivem com HIV em todo o mundo. Esta pequena pílula nos dá esperança.

Sabemos que podemos vencer a guerra contra este vírus. Sabemos que com o tratamento, uma pessoa se iguala a outra. Você não precisa viver com medo de transmitir HIV para seu parceiro ou parceira. Sabemos que podemos ter crianças saudáveis, que nasçam livres do HIV, e sabemos que estaremos com vida para vê-los crescer.

Mas isto não é uma realidade para milhões de pessoas vivendo com HIV, que ainda vivem em constante medo e isolamento.

Quando soube do meu status de HIV, ainda tinha muitas perguntas:

  • Por que minha mãe mantém meu status de HIV em segredo?
  • Eu viverei uma vida normal, como todo mundo que vive sem HIV?
  • Eu tenho que tomar esta pílula para sempre?

À medida que fui crescendo, as respostas foram maldosas. Meu professor disse à minha turma para não falar com pessoas com HIV. Minha vizinha estava com raiva porque durante anos ela não sabia que eu tinha HIV. Percebi que meu status de HIV era um segredo sombrio para todas as outras pessoas em minha vida, mas não para mim.

Profissionais médicos não falariam COMIGO sobre a MINHA saúde, por causa das leis de consentimento dos pais. Eles só falavam com minha mãe. Foi por isso que encontrei minhas próprias respostas perguntando ao Dr. Google.

Depois fiz 16 anos e minhas perguntas mudaram:

  • E se eu encontrar alguém que eu ache interessante? Tenho que dizer a essas pessoas que tenho HIV?
  • Posso ter relações sexuais? Se eu fizer, vou transmitir HIV?
  • Devo usar o dinheiro no meu bolso para comprar um preservativo ou uma garrafa de cerveja?
  • O que acontecerá se eu parar de tomar esta pílula?

Percebi que milhões de outros e outras adolescentes se encontravam na mesma situação. Criamos o “Teenergizer” (Energia jovem, na tradução livre para o português), o primeiro grupo de apoio para adolescentes com HIV na Europa Oriental e Ásia Central.

Fomos às ruas e aos espaços públicos para conseguir mudanças nas leis e políticas. Lutamos pelo sigilo de profissionais médicos para pacientes adolescentes. Lutamos pela saúde sexual e reprodutiva e pelos direitos e educação sexual abrangente. Lutamos para ser ouvidos e ouvidas porque não há nada sobre nós, sem nós.

Mas não tínhamos o financiamento e a experiência necessária para que isso acontecesse. Eles nos disseram que éramos apenas crianças, enquanto as decisões sobre nossas vidas, nossa saúde e nosso futuro estavam sendo tomadas por pessoas adultas.

Somos mais do que nosso status de HIV. Temos um conjunto incrível de habilidades. Precisamos de serviços para nosso HIV, serviços de saúde mental e de apoio social, não importa quem somos ou quem amamos.

Este ano eu fiquei furiosa quando perdemos Diana. Ela nasceu com HIV e tinha apenas 19 anos. Mas ela tinha comprimidos que eram impossíveis de tomar, nenhum apoio à saúde mental e nenhuma confidencialidade.

E se a Diana tivesse nascido em Nova York? Ela teria tido o melhor tratamento para o HIV, através de uma injeção que ela poderia tomar uma vez por mês. Em uma clínica que a tratasse como uma jovem adulta, e não apenas como um diagnóstico. Ela poderia ter viajado, trabalhado ou estudado em qualquer lugar, porque seu status de HIV não seria uma barreira para viver uma vida feliz.

Estas coisas são uma realidade para algumas pessoas que vivem com HIV, mas não para Diana. Como milhões de pessoas com HIV, ela morreu por conta das desigualdades. Milhões de pessoas com HIV podem ter medicamentos que controlem o HIV, mas vivem em um mundo onde suas famílias e suas sociedades não as aceitam pelo que são.

Estou aqui hoje como a voz de 38 milhões de pessoas vivendo com HIV. Para algumas pessoas, estas pílulas estão nos mantendo com vida.

Mas estamos morrendo devido à pandemia do estigma, da discriminação e da falta de flexibilidade do Acordo TRIPS.

Presidente Biden, você pode mudar nosso futuro. Assim como você fez com a COVID-19, você pode tornar as tecnologias de saúde, tratamentos e vacinas de ponta aqui nos Estados Unidos disponíveis para todas as pessoas, em qualquer lugar.

A resposta à AIDS ainda está deixando milhões para trás. Pessoas LGBTQI+, profissionais do sexo, pessoas que usam drogas, migrantes e pessoas privadas de liberdade, adolescentes, jovens, mulheres e crianças que também merecem uma vida comum, com os mesmos direitos e dignidade desfrutados pela maioria das pessoas nesta sala.

Eu não sei como é uma vida normal, mas não deve terminar como a de Diana.

Durante a pandemia de COVID-19, o mundo mudou muito rapidamente. Milhões de pessoas perderam seus empregos, famílias foram destruídas e as pessoas jovens estão sentindo estresse, depressão e ansiedade, estão usando mais drogas e tendo relações sexuais que as expõem a mais riscos. A violência, as desigualdades e o radicalismo estão aumentando. Por que não podemos usar este momento para construir um mundo melhor e mais justo?

Para alcançar o fim da AIDS até 2030, precisamos urgentemente de atenção e recursos para as pessoas mais afetadas, como as da Europa Oriental e Ásia Central.

Podemos acabar com a AIDS até 2030? Sim, mas somente se fizermos algumas mudanças radicais. O que me leva à minha última pergunta.

Esta reunião assumirá novos e ousados compromissos. Mas, sinceramente, se quisermos fazer mudanças reais, estas quatro coisas devem se tornar realidade:

  1. Educação sexual abrangente em todas as escolas, em todos os países
  2. Apoio psicossocial e educação entre pares para cada adolescente com HIV e jovens de populações-chave
  3. Disponibilização de serviços comunitários de HIV imediatamente como uma realidade, não como exceção
  4. Finalmente obtemos uma vacina contra o HIV e uma cura funcional

Não estou sonhando em acordar em um mundo de fantasia, livre de estigma e discriminação. Estou pronta para trabalhar todos os dias com todos vocês para tornar estas coisas uma realidade.

E, como eu, há mais de um bilhão de jovens que querem assumir a liderança. Mas não podemos fazer isto sem apoio. E estamos exigindo que vocês deem um passo à frente e finalmente façam a sua parte.

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