Opinião: o mundo só pode vencer a AIDS se acabar com as desigualdades que impulsionam a epidemia

Este artigo apareceu primeiro no The Parliament Magazine.

Quarenta anos desde que os primeiros casos de AIDS foram diagnosticados, a luta contra o HIV continua. Embora o mundo tenha desenvolvido o conhecimento científico e a experiência médica para manter as pessoas vivendo com HIV vivas e saudáveis e prevenir novas infecções pelo HIV, não estamos no caminho certo para acabar com a epidemia da AIDS como uma ameaça à saúde pública até 2030.

Em 2019, quase 700 mil pessoas morreram de doenças relacionadas à AIDS. Um número impressionante de 1,7 milhões de pessoas foram infectadas pelo HIV – mais de três vezes a meta estabelecida em 2016, o que nos teria colocado no caminho certo para acabar com a epidemia da AIDS.

Os medicamentos, informações e ferramentas de prevenção simplesmente não estão alcançando as pessoas que mais necessitam. Precisamos de uma nova abordagem que reduza as desigualdades que impulsionam a epidemia de AIDS e coloque as pessoas no centro, priorizando os direitos humanos, o respeito e a dignidade.

As injustiças e desigualdades sociais alimentam as epidemias. Por exemplo, a epidemia de AIDS está causando um impacto devastador sobre toda uma geração de jovens mulheres e meninas na África subsaariana. Cerca de 4.500 adolescentes e jovens mulheres entre 15 e 24 anos de idade adquirem o HIV toda semana nesta região, além disso é duas vezes mais provável que essa população viva com o HIV se comparado aos seus pares masculinos.

Ao mesmo tempo, meninas e mulheres jovens enfrentam violência sexual e de gênero, gravidez indesejada e podem ser forçadas a abandonar a escola. No entanto, a conclusão do ensino médio, incluindo uma educação sexual abrangente, é uma das formas mais seguras de manter as jovens mulheres e meninas livres do HIV.

Também é profundamente preocupante que mais de 60% das novas infecções por HIV ocorram globalmente entre as populações-chave (gays e outros homens que fazem sexo com homens, pessoas que usam drogas, profissionais do sexo, pessoas trans, pessoas em privação de liberdade e migrantes) e seus parceiros e parceiras sexuais. Comunidades e grupos inteiros de pessoas estão sendo excluídas do direito à saúde, ao bem-estar e à dignidade porque são marginalizadas e criminalizadas.

Isto pode – e deve – mudar.

A Estratégia Global para AIDS 2021-2026 do UNAIDS fornece orientações claras e eficazes sobre o que precisa ser feito para criar sociedades mais justas para colocar o mundo novamente no caminho certo para acabar com a epidemia de AIDS como uma ameaça à saúde pública até 2030.

A estratégia visa colocar as pessoas no centro, removendo barreiras sociais e estruturais que impedem o acesso das pessoas aos serviços de HIV, capacitando as comunidades a liderar o caminho, fortalecendo e adaptando os sistemas para que trabalhem para as pessoas que são mais afetadas pelas desigualdades, e mobilizando plenamente os recursos necessários para acabar com a AIDS.

A União Européia tem a bagagem política, o poder financeiro e as ferramentas políticas para contribuir significativamente para a luta global contra o HIV/AIDS. O Parlamento Europeu acaba de adotar uma Resolução sobre a aceleração do progresso e enfrentamento das desigualdades para acabar com a AIDS como uma ameaça à saúde pública até 2030, em resposta à Estratégia Global para a AIDS.

Ele delimita ações concretas que a União Europeia deve tomar para acabar de uma vez por todas com a AIDS. Estas incluem apoiar os esforços dos países parceiros para construir sistemas de saúde fortes e resilientes capazes de oferecer uma cobertura de saúde universal sensível ao HIV, priorizar a saúde como parte das relações União Europeia-África e aumentar os investimentos no UNAIDS e no Fundo Global de Combate ao HIV, Tuberculose e Malária.

A resolução também procura mobilizar a liderança da União Europeia na abordagem dos direitos humanos e dos fatores de desigualdade de gênero do HIV/AIDS e assegurar que a União Europeia apoie as respostas lideradas pela comunidade como componentes-chave para uma resposta eficaz ao HIV/AIDS.

No próximo mês, os países se reunirão para a Reunião de Alto Nível da Assembléia Geral das Nações Unidas sobre HIV/AIDS, onde é espera que apoiem um novo plano ousado para acabar com a epidemia de AIDS, incluindo novas metas para 2025.

Ao atingir essas metas, o número de pessoas recém-infectadas por HIV cairá para 370 mil até 2025, e o número de pessoas morrendo de doenças relacionadas à AIDS será reduzido para 250 mil. Combater as desigualdades que alimentam a epidemia do HIV será crucial para o sucesso.

A pandemia da COVID-19 expôs profundas desigualdades sociais e econômicas, sistemas de saúde pública subfinanciados e a fragilidade das respostas globais. Certamente, a COVID-19 está ameaçando bloquear os ganhos duramente conquistados pela resposta ao HIV/AIDS, ameaçando ainda mais o progresso rumo ao fim da AIDS até 2030.

Ao mesmo tempo, os países estão aproveitando a infraestrutura do HIV e as lições aprendidas ao lidar com a epidemia do HIV para uma resposta mais robusta a ambas as pandemias. De fato, temos uma oportunidade única de traduzir o direito à saúde em sistemas baseados em direitos, equitativos e centrados nas pessoas.

Devemos utilizar esta oportunidade para intensificar a solidariedade global, incluindo investimentos sustentados no desenvolvimento, construir sociedades mais resilientes que reforcem a segurança de todas as pessoas.

A União Europeia e o UNAIDS compartilham valores centrais de humanidade e igualdade para garantir que ninguém fique para trás. O fim da epidemia de AIDS até 2030 continua ao alcance do mundo, mas isso não pode ser feito sem criar sociedades mais fortes construídas sobre os princípios de igualdade de gênero, justiça social e o reconhecimento dos direitos humanos universais, incluindo o direito à saúde e aos direitos sexuais e reprodutivos.

Se isso não for feito, a vida de milhões de pessoas ficará em risco e prejudicará a missão comum de alcançar a Agenda de Desenvolvimento Sustentável de 2030, incluindo o fim da AIDS como uma ameaça à saúde pública.

Por Winnie Byanyima, Diretora Executiva do UNAIDS; e Tomas Tobé MEP, Presidente da Comissão de Desenvolvimento do Parlamento Europeu.

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